sábado, 31 de dezembro de 2005

E agora algo completamente diferente...

...um artigo cujo tema nada tem a ver com a passagem de ano. 

Nesta última semana mergulhei no mundo de Ian Curtis. Após ter recebido o livro Touching from a Distance no Natal, biografia escrita pela sua mulher Deborah Curtis, e de o ter lido até à última página, fiquei a conhecer o Ian de uma forma mais profunda. 

Vi a sua faceta humana, o desvendar do mito. Quase da mesma maneira que fiquei a conhecer a verdade sobre a vida de Jesus depois de ver alguns documentários interessantes no Discovery Channel. Mas, ao contrário do segundo, Ian era um verdadeiro mito. Um ícone de uma geração, e alguém que eu vinha a mistificar. 

A biografia de Ian Curtis tem potencial para chocar a grande maioria daqueles que a lerem, mas não a mim. A sua verdadeira história não me surpreendeu. Ele continua a ser o mesmo mito que era, embora já não seja aquele ser perfeito, que honestamente, nunca foi. 

O Ian foi um revolucionário, um mártir. Nas palavras de Tony Wilson, The musical equivalent of Che Guevara

Ele foi o que teve de ser. A sua vida não lhe proporcionou que fosse outra coisa. Levou os Joy Division ao topo. Levou-se a si próprio ao extremo, e aos 24, terminou com a sua vida. 

Ian podia ter sido gigantesco, por mais impossível que pareça tentar elevá-lo mais alto do que ele já é. Motivou os U2, e deixou algum legado nos New Order. Ele estava demasiado à frente do seu tempo, e já era uma figura maior que a própria vida. Só na morte se viu a essência da sua verdadeira grandeza. 

Continua a caminhar em silêncio Ian! 



Publicado em 17 de Julho de 2013

sábado, 24 de dezembro de 2005

The Night Before Christmas

Ou Consoada, como aqueles de alma lusitana gostam de lhe chamar. Não venho aqui falar do sentido do Natal, todos sabem qual é. Não quero falar do que está mal no Natal actual, ou melhor, da maneira que as pessoas encontraram para estragar esta quadra. Falar disso apenas ofusca e ridiculariza o verdadeiro sentido do Natal. 

Que importa se Jesus não nasceu nesta noite? Para mim, o meu aniversário é um tempo de reflexão. Aquele sentimento de obrigação, estampado nos vossos olhos, quando me felicitam nesse dia, apenas contribui para a minha infelicidade. 

O dia em que nascemos é importante, e deve ser recordado por nós. O dia em que os outros festejam esse acontecimento, pouca importância tem. A verdade é que este dia transcendeu o nascimento de Jesus e aglomerou tradições dos quatro cantos do mundo. Tradições milenares que não foram esquecidas graças à celebração deste dia. 

Muito além deste sentido de preservação, também há o sentido de reflexão. O Natal é o momento para nos esquecermos do ano que passou. Para deixar as coisas más no armário, e para dar uma olhadela no álbum das boas memorias. 

É a altura perfeita para fazermos uma viagem pessoal, fora do nosso ego. Para esquecermos o egoísmo, e para procurarmos fazer alguém, e nós próprios, felizes. Seja com uma prenda ou com um simples gesto. 

Não digam mal do Natal. Por muitos anos o adoraram. Ao longo dos séculos foi um símbolo de união entre povos. É um sinal de esperança para o Futuro. O ponto de partida para a Paz e para a Solidariedade. 

O Natal é o que é. É o que fazemos dele, e não o que os outros fazem dele. 

Aproveitem o Natal. Deixem-se envolver pelo seu verdadeiro sentido. E lembrem-se, nem que seja apenas por um milésimo de segundo, mas lembrem-se de serem felizes. Não há melhor dia que este para o serem. 

Desejo-vos uma boa noite de consoada. Façam do Natal aquilo que o vosso coração quer que ele seja. 

Feliz Natal para todos, e para todos uma boa noite. Hoje todos nós somos iguais aos olhos uns dos outros. 

Ámen 
Publicado em 16 de Julho de 2013

sexta-feira, 23 de dezembro de 2005

A Véspera da Véspera de Natal

Já dizia alguém que percebe do assunto: Nós temos 365 maneiras de fazer bacalhau! Pois a mim só me interessa a maneira 358 – como génio mal compreendido da matemática, explico para aqueles que não o são, que esse número corresponde ao dia 24 de Dezembro, pelo menos em anos que bissextos não o são. 

Hoje é a véspera da véspera de Natal, a véspera da Consoada, ou simplesmente o dia 23 de Dezembro. 

Já era madrugada de 22 para 23, quando a minha contínua busca de conhecimento, leva-me a iniciar uma conversa com uma conterrânea da formosa Invicta, e a descobrir mais um dos males impostos por estes anos de refúgio ovarino. Era do meu total desconhecimento o que eram Pencas. 

Isto não é bem verdade, no limiar da minha cabeça “penca” era sinónimo de “nariz”, mas aqui voltamos à eterna luta entre o pingo e o garoto. A penca para esta conterrânea, e para todos os seus conterrâneos, é uma couve repolhuda, que por estas bandas tem o nome de Couvões. Para meu espanto, na Consoada juntamos ao azeite, à batata cozida, àqueles verdes que nunca como, à pimenta e ao alho, as ditas Pencas. 

No meio de narizes e Bacalhaus (que os nossos amigos Ingleses são incapazes de pronunciar devido à inexistência do som "lh" na sua fonética, acabando por graciosamente sair esta palavra risível de se ouvir: bacaíau) acabamos por nos sentar à mesa, amanhã, na véspera do dia de Natal, prontos para encher a pança com esta iguaria. A ela juntam-se os bilharacos, feitos de abóbora ou de cabaça (mais uma luta eterna), o tão dito e declarado Pão-de-Ló, não o Portucalense que esse nem de bolo seco merece ser chamado, mas a iguaria vareira, que há tantos anos dá "nome" a este sítio, as frutas cristalizadas, os pinhões, e etc., e etc. 

Não quero falar da aletria, ou da letria, que já muitos desgostos me trouxe. Mas que estou para aqui a dizer? O importante são as Pencas, minhas senhoras e meus senhores. Essas maravilhas do mundo vegetal que a minha Mãe chega a ter em excesso no quintal. 

De Couvões pouco percebo. Serão angiospérmicas? Espero que não, já que nem sei o que angiospérmicas são. Só sei que no meu prato vão aparecer, não será sinónimo de eu as ir comer, mas pelo menos lá estarão. 

Depois da tempestade a bonança. Mas ainda é dia 23, coitado deste dia, ser véspera de véspera é como ser deputado, é ser nada sem significado. Mas do Nada, já falei, ao Pai Natal escrevi, do Natal em si, esperarei, e em breve comentarei. Até lá só digo assim: Morre Pencas, morre! Pim! 

Publicado em 15 de Julho de 2013

segunda-feira, 19 de dezembro de 2005

Algumas coisas que não me agradam

Como estamos em época natalícia, e para contrariar um pouco a onda de boas festas e de felicidade, provocada por este povo endoidecido, decidi listar neste sítio algumas das coisas que não me agradam – queria ter usado o termo odeio, mas achei-o demasiado forte para a ocasião. 
  1. O SL Benfica, não só o clube, mas também a instituição, os seus afiliados e dirigentes; 
  2. Todos os mouros que andam por aí a injuriar o Norte, enaltecendo a "grandeza" de Lisboa, que de grande apenas tem a estupidez dos actuais e anteriores habitantes dos palácios de S. Bento, e de Belém; 
  3. O Dantas. Morre Dantas, morre. Pim! (Não sei, nem quero saber quem foi o Dantas, mas também não me agrada...); 
  4. Activistas que em meia dúzia de testamentos acabam por dizer rigorosamente coisa nenhuma; 
  5. Velhas, perdão, idosas, que passam por aqui por casa, e todas aquelas iguais a essas mesmas, que agem da mesma forma, assim como todas aquelas que simplesmente o são, e teimam em o ser; 
  6. Bento XVI, que com medo de mostrar sinais da sua homossexualidade impediu aqueles que esse medo não têm, de exercer o sacerdócio; 
  7. Todos aqueles que levam os provérbios à letra e têm medo de assumir as suas convicções e levá-las avante; 
  8. O Senhor Doutor Engenheiro Arquitecto Professor Palhaço Energúmeno George W. Bush. Terei mesmo de explicar porquê? 
  9. O Capitalismo Americano e todos os seus ideais. Dêem-me um desconto; 
  10. Todos aqueles a quem lhes parece que aconteceu não sei o quê, mas esses até perdoo pois lá me rio um bocado; 
  11. Toda a cultura barata de massas, que também chamo de cultura de casa-de-banho, que infelizmente por pertencer às massas, vejo-me obrigado a ouvir nem que seja de relance, se me apetecer ver TV, ou sair à rua. Mesmo enquanto escrevo este artigo estou a ver uma publicidade dessas no canto superior direito do monitor; 
  12. O SL Benfica. Não fosse o três o número da tragédia, que espero que se repita para os lados da Luz; 
Não quero correr o risco de dar um décimo terceiro motivo. O 13 é número de mau agoiro para vários lados e, como sou um cidadão europeu, vou deixar o doze como o número de estrelas da minha bandeira. Muita coisa foi deixada por se dizer, mas nunca devo parar de enaltecer por fim: Morre Dantas, morre. Pim! 

Publicado em 14 de Julho de 2013

sábado, 10 de dezembro de 2005

Nada

A verdade crua e fria, ou fria e crua, ou somente fria, (nunca cheguei a saber como é que se diz esta expressão correctamente) é que não tenha nada para dizer.

O que é o nada se não algo? Já disse muitas vezes que estava a fazer nada quando estava a fazer algo. O próprio acto de abrir a boca para dizer a palavra, ou de mexer os dedos para a dactilografar, é algo. E antes mesmo de fazer isso, estava a olhar, a pensar, a respirar. Mesmo estando parado, estou a fazer algo. Até um vegetal faz algo quando parece fazer nada.

Agora o nada, o que é o nada? O vácuo? Mas o vácuo não é nada, é algo, é o vácuo. É a ausência de qualquer coisa, não é o nada. A própria palavra “nada” é algo já de si, é uma palavra, é uma forma do verbo nadar. Até aí já é qualquer coisa para além do nada.

Para muitos, o nada é aquilo que surge depois de morrermos, mas isso também não é nada, é algo, é a morte.

Será o nada mais um mito urbano? Talvez, se pensarmos bem, as coisas que consideramos como sendo nada, o branco, o vazio, a morte, a paragem e a inoperação de alguma ocorrência. Tudo isto, não é nada, é algo, algo que está definido. Então o nada é o metafísico, é algo que desconhecemos. Também o que desconhecemos é algo. Irá ser descoberto mais cedo ou mais tarde. Isso também não é o nada.

Raios, afinal o que é nada? Nada, o nada não é nada, nada é nada, o nada não existe. É um pigmento da nossa imaginação, como tantas outras coisas que sentimos preguiça, ou um desejo tremendo em definir. O nada simplesmente é o que é, ou melhor, o que não é. O nada, nada é. O nada é o próprio nada.

Como já tinha referido, eu não tenho nada para dizer, mas esse nada tornou-se em algo. Tornou-se neste texto que na verdade fala de nada, pois é ao Nada que é dada toda a importância. É pelo nada que este artigo existe. Perguntam-me, o que é o nada? É algo que se deixa passar por nada.

Publicado em 11 de Julho de 2013

sábado, 3 de dezembro de 2005

Querido Diário

Ainda bem que até gosto de sequelas. Não, ainda não descobri outra palavra.

Estar constipado não é mesmo nada agradável. Drogam-me no primeiro dia e deixam-me os restantes para ser um mero observador na guerra, já milenar, entre o meu nariz e um qualquer pobre lenço corajoso, que se atravessa no seu caminho.

Lembras-te quando, numa tarde de um dia qualquer, limitei-me a fazer nada? Não? Eu também não. Se não, teria simplesmente escrito o dia, a hora, e o local. Nessa tarde criei este blogue e, muitas tardes depois, escrevi o meu primeiro artigo. Era sobre o Sporting CP. Depois desse artigo nunca mais toquei no assunto futebol, muito por causa dos poucos "ouvintes" que este blogue tem. Mas agora estou com vontade de o fazer, mas para não me sujeitar à inexistência de críticas, preferi dizer-to a ti.

Não sei se viste o jogo de ontem. Eu vi. Devo ser o único a dizer isto mas o Sporting CP merecia ter ganho. Podem ter existido penalties, até pode ter sido o FC Porto a equipa que mais atacou, mas desde quando é que o futebol é assim tão linear? A verdade é que nunca o foi.

A meu ver, o Sporting CP marcou o primeiro golo, e só sofreu o golo do FC Porto alguns minutos após a lesão do Carlos Martins. Sempre acreditei neste miúdo, e vá lá que alguém teve juízo para o pôr a jogar. Para além da clara diminuição da qualidade de jogo do Sporting CP após a saída deste miúdo, o golo apenas surgiu num lance caricato culminado com um auto-golo do Polga.

Se o Sporting CP não fosse o Sporting CP, mas o Vitória de Setúbal, o Boavista, ou uma qualquer equipa italiana, aquele golo só teria entrado por obra e graça do Espírito Santo. Logo, o resultado seria sempre 0 - 1, e nunca 2 - 1, pois não houve mais nenhuma bola a entrar na baliza do Ricardo.

Mil e uma coisas podem ser ditas, mas a verdade não deixa de ser esta: se tudo tivesse corrido normalmente, o Sporting CP tinha saído do Dragão com os três pontos. Mas tudo não correu normalmente, e o FC Porto lá roubou dois pontos ao Sporting.

Não concordas comigo? Sei que não tens muito remédio, ser inanimado que tu és. Agora devo voltar a outros afazeres. Não percas brevemente a tua quarta parte, neste mesmo blogue, num PC perto de ti.

Publicado em 10 de Julho de 2013

VII

Sol de Inverno (título original)
Sol de Inverno,
Húmido e doente.
De brilho cego e frio.

As nuvens são o meu consolo.
Quando tu desapareces,
Ó Sol invernoso,
Como não te aguento.

Mesmo no Outono já dói,
Já magoas os dias,
Já não és bem-vindo,
Já não quero a tua luz.

Desaparece, ó Sol.
Ó dador de vida,
Ó estragador dos dias.
Traz-me nuvens que iluminem,
Chuva que me aqueça,
Só não te tragas a ti 
Publicado em 9 de Julho de 2013

quinta-feira, 24 de novembro de 2005

Querido Pai Natal

Há muito tempo que não te escrevo. Há muito tempo que não me respondes. Tenho saudades daquelas manhãs de Natal, em que acordava e todas as prendas que eu te tinha pedido, com excepção de algumas que, agora que olho para trás vejo que foram pedidos completamente sem sentido, estavam ali na cozinha, ao lado do meu sapato. 

Uma vez, até me esqueci de uma delas, que ficou perdida atrás da mesa. Lembraste daquela vez que te esqueceste do teu gorro? Queria muito tê-lo aqui comigo. Talvez um dia pergunte à minha Mãe onde ele está.

Este ano voltei a portar-me mal e acho que não mereço que me visites. Não que alguma vez o tivesse achado, mas Tu lá vinhas. Eu não sou um dos bons. De certeza que há muita gente por aí que merece mais as minhas prendas. Não me importo que continues a não me visitar. Os meus pais e eu trataremos de arranjar aquilo que quero ou que preciso. Afinal como é que os teus duendes vão fazer DVDs? Só queria que me voltasses a responder.

Gostava de ter uma lareira para escrever esta carta e queimá-la, como ouvi dizer que faziam na Dinamarca. Terei que ter esperança em que já te tenhas dedicado às novas tecnologias, e que um dia venhas a ler esta carta que hoje te escrevo.

Agora sou capaz de compreender o porquê de Tu existires, assim como o porquê de certas pessoas precisarem que Tu existas. 

Eu sempre adorei o Natal. Não só por Ti, mas também pelo Menino Jesus, embora ele tenha nascido a 17 de Abril. Daqui a poucas semanas vou montar as árvores e enfeitar a casa. Vou comer rabanadas, bilharacos, fruta cristalizada e bacalhau. Vou abrir as prendas, algumas já mais que anunciadas, outras, apenas meros envelopes com papéis de tecido, alguns chocolates, e algumas peças de roupa para pôr num canto do meu armário. 

O próximo ano será diferente. Eu sei que vai ser. Só gostava que fosse melhor. Até lá, fico à tua espera. Nunca te esquecerei Pai Natal.

Um abraço, do mesmo de sempre.
 

Publicado em 8 de Julho de 2013

E agora algo completamente diferente...

Imagem DR
Llanfairpwllgwyngyllgogerychwyrndrobwllllantysiliogogogoch

Não, isto não são letras ao acaso. Este é o nome de uma cidade do norte do País de Gales. Na foto podem ver o placar da estação com o nome da cidade.

Este nome quer dizer o seguinte:

St Mary's church in the hollow of the white hazel near a rapid whirlpool and the church of St. Tysilio of the red cave.

A Igreja de St Mary na cavidade da avelã branca perto de um remoinho com rápidos e a Igreja de St. Tysilio da caverna vermelha.

Talvez fosse mais fácil chamar-se SítioComNomePraticamenteImpronunciável.

E esta, hein?


Publicado em 7 de Julho de 2013

sábado, 12 de novembro de 2005

VI

Um dia de Chuva (título original)

Mais um dia de chuva.
Mais uma gota que cai.
Vejo, nesta janela embaciada,
Um rosto que não me diz nada.

Essa sombra desaparece,
E só cinzento, e gotas se sente
Cá dentro, um frio. Um momento.
E nada de mais.

É apenas outro dia chuvoso.
Mesmo estando o sol a brilhar,
As nuvens não irão cessar.
O céu, cinzento permanecerá.

Procuro o teu gesto no horizonte.
Ou qualquer outro gesto,
Mas nada encontro.
Apenas nada de mais.

Demasiado nada para continuar a olhar.
Volto-me da janela,
E sou levado para outro nada.
Onde nada espera te encontrar.


Publicado em 4 de Julho de 2013

quinta-feira, 10 de novembro de 2005

O Milagre

Nossa Senhora de Fátima
Recentemente li um livro intitulado "O Terceiro Segredo". O autor, de nome Steve Berry, é um americano que já desde tenra idade se fascinou por Fátima. Apesar de ser um bom português, não imaginava quão grande era o impacto que Fátima tinha no resto do mundo. 

Todos acordámos em certas manhãs, e ligámos a TV para ver as celebrações das Eucaristias em Fátima. Milhares de fiéis sempre presentes, faça chuva ou faça sol. Todos ali, atentos às palavras do sacerdote que a estivesse a celebrar. 

Embora já tenha visitado Fátima várias vezes, nunca reparei na mediatização que existe à volta dela, nem no número gigantesco de fiéis que a ela são atraídos todos os anos, provenientes dos quatro cantos do mundo. Eu sei que a Terra é quase uma esfera, e que por isso não tem cantos, mas isso fica para outro artigo.

Era 1917, três pastorinhos guardavam o seu rebanho na Cova da Iria, assim era chamado o local, quando as suas atenções são desviadas para uma senhora de branco. Quase cem anos depois, o sentimento de espanto das pessoas que presenciaram a sua última aparição, quando assistiram, perplexas, ao Sol a dançar no céu, continua a atrair os fiéis. Tudo por uma questão de fé? Não o diria de outra maneira.

Muitas pessoas descreditaram as aparições, argumentando que o que se passou não era mais do que um episódio de histeria em massa. Também sou um desses cépticos contudo, gostaria de ter estado lá, para testemunhar com aquelas pessoas o que verdadeiramente se passou. 

Penso em todas as questões que se levantam, e em toda a vontade de desacreditar o que lá aconteceu. Mesmo assim, quase cem anos depois, continuo a ligar a TV, e a ver o Santuário apinhado de gente. Não seria tão bom que esta história fosse real? Qual é o mal em ter um pouco de fé? Não é ela que nos ajuda a encontrar um significado para a vida? Ou a aceitar que a vida tem um significado? 

Para mim, é difícil aceitar isto tão abertamente. Tive que esperar até ser Confirmado para começar a questionar verdadeiramente a minha fé. Como alguém uma vez me disse, não devia ter feito o Crisma se não estivesse pronto. E não estava. Mas agora sou um Confirmado, pelo menos aos olhos da Igreja. Mas o assunto, não sou eu, nem essa instituição, o assunto é Fátima. 

A Nossa Senhora, a "Virgem", a Madona, a Mãe de Jesus, desceu aos céus para dar três mensagens a três pastorinhos. Ou melhor, a dois, pois Francisco nunca chegou a ouvir o terceiro. 

No romance de Steve Berry, o terceiro segredo revelado por João Paulo II no ano 2000, era o tema principal. A premissa do livro afirmava que faltava uma parte do segredo, e que o Papa esqueceu-se de a dizer, por desconhecer a sua existência. Essa mensagem, como qualquer leitor viria a descobrir no fim, era uma mensagem de aceitação. Aceitação do amor em todas as suas formas, mesmo por parte de "Homens de Deus". Aceitação do direito da Mulher em escolher se vai ou não ser mãe. Resumidamente, a quebra de todos os dogmas que a Igreja tem vindo a reivindicar através da "palavra" de Deus. 

Mas este livro, ao contrário de outros, não desacreditava o papel da Igreja. Apenas lhe dava um empurrão para que esta pudesse mudar, e adaptar-se àquilo que os Céus realmente querem ver-nos a fazer cá em baixo. 

Na verdade, com um Deus tão liberal, e com um Terceiro Segredo de Fátima tão apelativo, até ponderava tornar-me crente. Pelo menos, aprendi a não ignorar este milagre que aconteceu aqui tão perto de nós, e que para todo o sempre dará outro sentido, não só a Portugal, mas à nossa própria existência.

Publicado em 3 de Julho de 2013

domingo, 6 de novembro de 2005

Cursos e Sonhos

Acabei o liceu, e agora? Todos acabamos por fazer esta pergunta. Ninguém acharia isto estranho, contudo, o que eu acho estranho é a resposta que mais frequentemente se faz ouvir: “Gostava de ir para Medicina”.

Há uns meses atrás assisti a uma palestra de um Professor da Universidade de Coimbra. Nela, ele apelava a um maior interesse pelas ciências, que ultimamente têm perdido muitos alunos para as ciências sociais. Não sei se a Medicina é considerada uma ciência social, duvido muito que o seja, mas concordo que esta deve ser posta de lado quando falamos de cursos científicos.

É estranho o elevado número de alunos que, tendo escolhido no nono ano um curso científico, acabam por ambicionar seguir Medicina. Não me considero um jogador compulsivo, mas era capaz de apostar que a grande maioria deles não quer na verdade seguir isso.

Os alunos de hoje vêem os seus caminhos bloqueados por cartazes a dizer-lhes para encarar uma realidade fantasiosa, e falaciosa, que é exposta na comunicação social, e canalizada pelos seus pais. Foram muitas as vezes que alguém me disse que tinha como sonho seguir um curso ligado às Ciências, como Biologia, Geologia, Física, ou Astronomia. Infelizmente, desistem afirmando que esses cursos não têm saída. Porque é que a grande maioria dos jovens teima em matar aquela criança que sonhava com um dia chegar às estrelas?

São vítimas da pressão dos pais? Dos amigos? Da sociedade? Ou talvez, vítimas de uma vontade tremenda de crescer demasiado depressa. Não ponho de lado a certeza de que alguns deles têm mesmo como sonho seguir Medicina. Mas todos aqueles que mudaram o seu sonho por outro motivo que não a perda de interesse, estão a cometer um erro, e vão passar o resto das suas vidas arrependidos por o terem feito.

Não deve existir nenhum motivo para pararmos de sonhar. O vosso sonho não tem saída? Já pensaram que, como a maioria escolhe apenas os cursos com saída, que talvez a procura pelo vosso emprego de sonho aumente, devido à diminuição de pessoas formadas nessas áreas, e que tenham assim uma hipótese muito maior de arranjar emprego, do que qualquer aluno de Medicina?

De qualquer das formas, quem faz o que gosta, e é bom a fazê-lo, não tem problemas em ter sucesso. É com este pensamento que devem fazer a vossa escolha. Não sigam os conselhos dos vossos pais, amigos, familiares ou professores. Sigam o caminho que o vosso coração vos quer mostrar. Ponham de lado essa perspectiva pessimista da realidade. As pessoas à vossa volta são portugueses, não têm outra escolha que não serem pessimistas. Não se deixem influenciar por quem apenas quer transmitir para vocês a sua forma de pensar.

“Vou seguir Medicina (ou outro curso qualquer) porque tem saída.” Quando esta frase se extinguir, talvez aí passemos a ser vistos como um povo mais optimista. Cabe a vocês, e às vossas convicções, dar ouvidos ao que deve ser ouvido: Os vossos instintos. Eu sonho um dia ser feliz com aquilo que faço, e vocês?

Publicado online em 6 de Novembro de 2005
Publicado pelo Jornal "A Melga" em Junho de 2006
Reeditado em 2 de Julho de 2013

quinta-feira, 13 de outubro de 2005

Senta-te e Lê

Após um breve período de inspiração, volto aos artigos sérios que remetem a temas talvez mais do vosso interesse.

Se algum membro da blogosfera, ou um simples escritor, um dia ler isto, vai concordar plenamente comigo. Quantas vezes as musas vos atacaram com tanta força que, quando começaram a escrever, só acabaram quando o texto já ia longo? Incontáveis, certamente.

Após a conclusão de tal grandiosa obra – que depois de uma segunda ou terceira leitura, acabamos por deitar para o lixo; tão perfeccionistas que somos, acabamos por encontrar demasiados defeitos, e tornamos algo belo em mais uma bola de papel, que teima em falhar o cesto –, queremos sempre ouvir uma segunda opinião, uma crítica, e quanto mais trabalhada e concisa esta for, melhor. Daí vem a questão que dá motivo à existência deste artigo: Quantas pessoas recusaram-se a ler por acharem que esse texto era grande demais?

Não é preciso responder a essa pergunta. Hoje em dia, vivemos numa sociedade extremamente materialista. Numa sociedade fast food, onde tudo tem que ser feito com a mais extrema rapidez. Chegamos ao ponto de protestarmos quando um desejo momentâneo não está logo pronto para ser satisfeito, cinco segundos antes de o desejarmos. 

Esta mentalidade tornou-nos preguiçosos. Incapazes de fazer seja o que for. Um bom artigo que dá gosto de ler, não é um artigo bem estruturado de uma página, mas sim uma frase ou duas, ditas por um “dito cujo” qualquer, que, tão convicto do seu raro momento de inteligência, acaba por se enganar a si próprio, ao pensar que essas frases realmente significam alguma coisa.

É verdade que a compreensão está dependente da extensão. É verdade que, por vezes, uma palavra diz muito mais do que mil. Mas essas mil palavras existem por algum motivo. Fazem parte da inspiração de alguém, do mundo de alguém, e merecem ser lidas. Afinal de que serviu o 25 de Abril?

Recentemente, acabei de ler um livro de 1421 páginas. Muitos espantaram-se com este feito. Perplexos, perguntaram-me como tinha sido capaz de arranjar tamanha paciência. A resposta é simples. Cada uma dessas 1421 páginas era boa, e interessante o suficiente para eu as ler. 

No outro dia, deparei-me com alguém que se recusava a ler um livro de uma escritora famosa, por achar trezentas e poucas páginas, um volume demasiado para com o qual, ocupar o seu tempo. Só lhe faltou cair os dentes quando lhe contei a minha aventura recente. 

Muitos livros, e muitos artigos, não valem a pena estarem em exposição nas estantes de uma livraria, ou nas páginas de um jornal, ou de uma revista. Mas muitos outros merecem-no, e por isso lá estão. Contudo, devido ao seu tamanho, a sua essência, a sua magia, perde-se no tempo. Deixando apenas a sua marca nas vidas de bravos como eu.

Apenas faço um pedido, para nunca julgarem um livro pela capa, pelo título, ou pelo seu tamanho. Mantenham um espírito aberto, e leiam. Não deixem bons artigos, e bons livros, passarem-vos ao lado, só porque não vos apetece perder umas horas. Horas essas, que iam gastar a fazer nada.

Quem sabe? Talvez algum deles sirva como fonte de inspiração, e vos ajude a encontrar a vossa vocação. Talvez um deles mude a vossa vida, e vos ajude num momento de aperto. Ou talvez vos seja útil, quando forem ao Quem Quer Ser Milionário. 

Talvez seja apenas um bom tema de conversa entre os vossos amigos. Ou um quebra-gelo, para conhecer pessoas novas. Mesmo que não passe de uma boa leitura para passar o tempo, não ponham logo de lado essa hipótese. Pois ninguém sabe que caminhos podem surgir ao virar da primeira página.

Publicado em 1 de Julho de 2013

sábado, 8 de outubro de 2005

Have a nice Journey

Era de manhã. Tinha acordado há pouco. Era um dia diferente, algo não soava como devia, o sol não brilhava como devia, algo estava para acontecer. 

Mesmo assim, segui com a rotina normal, e preparei-me para sair. Ao início da tarde dirigi-me à estação para ir viajar, alguém esperava por mim, algures a norte. A viagem é uma sombra na minha memória que se esvanece cada vez mais rápido. Mas, por mais ténue que seja, nunca esquecerei o momento em que a carruagem parou, e abri a porta para desembarcar. 

Lá estava quem me esperava. Quem eu queria. Quem precisava de mim. Quem eu não podia viver sem. Nada o podia prever. Talvez apenas aquelas sensações estranhas que tive ao acordar. Sempre vi a manhã como algo místico, algo que nos tenta abrir os olhos, mas mantive os meus fechados, e agora era tarde demais.

O edifício atrás dela tinha explodido, sobrevivi apenas com alguns arranhões, mas ela não. Esta vida podia ter sido salva. Esta vida não se limitaria a agradecer, mas para meu azar, a minha falta de compreensão, fez com que tudo isto acontecesse. Não a consegui salvar. Só quis morrer ali, enquanto sentia a sua vida a esvanecer-se nos meus braços. 

Nunca me perdoei. Nem a mim, nem ao mundo. Talvez fosse isso que despoletou os eventos do dia seguinte. Dia esse, que não foi mais nada do que o dia anterior.

Acordei exaltado, o telemóvel estava a tocar. Atendi-o como se estivesse a atender um auscultador de um telefone de rua que tinha sido cortado. Era ela, ela estava viva. 

Teria sido tudo um sonho? Já tive sonhos vívidos antes, mas nunca tão reais. Não, a razão dizia-me que não passava de um sonho, mas a verdade é que os meus instintos gritavam. Eu tinha recebido uma segunda chance, e não a podia desperdiçar. 

Cancelei o nosso encontro, pedi para adiá-lo para outra altura. Nessa noite, falámos sobre o quão horrível teria sido se eu o não tivesse cancelado. A estação onde nos devíamos ter encontrado horas antes, tinha explodido. O primeiro verdadeiro sinal de terrorismo neste país. 

Talvez agora, depois disto tudo, tenha mudado de ideias, mas se pudesse voltar atrás, faria tudo de novo. Afinal, com segundas hipóteses, ou sem elas, não podemos mudar o passado. Algo terá que o viver.

Umas semanas depois, recebi um telefonema, uma voz tremendamente familiar estava do outro lado da linha. Ele disse-me algo que parecia completamente irreal, mas, depois dos eventos passados, torna-se complicado distinguir o real do irreal. 

Concordei em encontrar-me com ele. O local era muito estranho, vindo directo de um filme de acção de Hollywood. Era suposto estar no terraço do prédio mais alto do centro da cidade, pelas dez da noite. 

Tentei contactá-la para que alguém soubesse onde, e com quem, eu estaria na eventualidade de algo me acontecer. Mas não consegui. Hesitei muito, mas lá ganhei coragem para ir ao encontro do destino.

Era noite, a Lua brilhava, mas as nuvens começavam a tapá-la. Ia começar a chover muito em breve. Apenas queria que aquilo acabasse depressa, e iria acabar.

Uma sombra surgiu por detrás da antena, aliás, não era uma, mas sim duas. Uma delas era estranhamente familiar, a outra era mais do que isso. Era ela. Estava presa e assustada, um estranho apontava-lhe uma arma. Fiquei paralisado. Consegui salvá-la apenas para a ver morrer nas mãos de um palhaço qualquer com sede de vingança?

Vingança? Porquê vingança? Que fiz eu de mal? A figura é-me familiar, mas de certeza que o que quer que seja que eu lhe tenha feito, nada justificaria esta atitude.

“Estou a ver que não te atrasaste. Impressionante, tendo em conta quem és”, disse a estranha figura que apontava a arma.

“Essa voz... Não, não pode ser...”

“Sim, diz olá a ti próprio.”

Isto era a gota de água. Eu? Porque raio queria eu matar aquela que dava o único significado à minha vida? E como estou eu ali?

“Não podes ser Eu! Quem és? Deixa-a em paz, ela não tem nada a ver com isto!”

“Ah, mas aí é que te enganas. Ela tem tudo a ver com isto. Lembras-te de um "sonho" que tiveste há algum tempo? Com explosões e comboios?”

“Sim, mas isso foi só uma premonição.”

“Não! Isso foi a minha vida. Eu fui o teu presente criado para que tu não sofresses. Não achas isso um pouco injusto? Venho aqui repor a justiça.”

“Que estás a dizer? Eu não tenho culpa do que te aconteceu, nem ela tem! Acredita, eu sei como te sentes, e se te dizes ser eu então serias incapaz de magoar aquela que amas.”

“Que estão para aí a falar? Deixa-me ir”, gritou ela em desespero.

“Ouviste-a? Deixa-a ir! Se queres vingança, vinga-te em mim.”

“Infelizmente, não é assim tão simples. Se te matar, eu também morro. Só vivo porque tu vives, e tu só vives porque eu vivo.”

“Então, se eu me atirar deste prédio abaixo, tu não vais ficar lá muito bem. Mesmo que eu sobreviva, vais ser um vegetal. Mas o mais provável é que morras comigo, certo?”

“Não serias capaz. Pensas que não te conheço? És um cobarde.”

“Tens assim tanta certeza disso? Então porque tremes?”

“Não, não faças isso! Se tu não vives sem mim, como pensas que eu viverei?”, disse ela, quando ele se dirigiu para o parapeito daquele terraço. 

“Vais ter que sobreviver. A culpa é toda minha, apenas não te esqueças do quanto eu te amo...”

“Não...”, a palavra saiu como um suspiro. Um último segredo entre os dois. Uma última tentativa desesperada de mudar o curso daquilo que era agora inevitável.

“Que estás a fazer? Pára!”, gritou a figura sombria.

E assim, saltei. Só me lembro de sentir a liberdade que é poder voar. Aqueles foram os últimos momentos da minha vida. Agora que a minha memória, que a minha essência, se desvanece, e que a minha alma começa a subir, apenas fico grato por ter sido amado, e por ter salvo aquela que verdadeiramente me amou. 

Sinto também pena pelo meu outro eu. Aquele que nunca chegou a ter estes últimos dias com ela. Nem tão pouco, o reconforto de saber que, algures, ela continua a viver a sua vida. Guardando para si, um lugar especial no seu coração, onde ele, tal como eu, seremos para sempre relembrados. 

Esta é a minha história. Despeço-me, uma última vez, sabendo que levo comigo a história de um verdadeiro amor.


Publicado em 30 de Junho de 2013

quarta-feira, 5 de outubro de 2005

O Mundo não era Suficiente

Tudo começou numa era não muito longínqua, numa terra perto daqui. O Mundo aproximava-se do seu fim, e o nosso herói viaja na última estrada que alguém alguma vez percorrerá. Com ele viaja um homem e uma rapariga. A rapariga não o sabia, mas era ela quem preenchia o coração dele, e quem tornava este fim mais suportável, ou, pelo menos, assim pensava ele.

O passado das personagens nenhuma importância tem. O que é importante é a viagem, e os eventos que em breve se vão suceder.

Ao longo do caminho, o silêncio é perpétuo. O rádio apenas grita estática, e não há grandes motivos de conversa. Ao aproximar-se o anoitecer, eles decidem parar um pouco, aparentemente sem qualquer motivo. 

Ele tenta falar com ela, mas os seus olhos afastam-se para aquele lugar distante, onde ele sabe que nunca a irá encontrar. Enquanto ele se vira para voltar para o carro, ouve um pequeno deslizamento seguido de um grito. Corre para ver o que se tinha passado. Ela tinha desaparecido. 

Aproximando-se do lugar onde ela estava, ele vê um pequeno desfiladeiro. Encontra-a agarrada a uns ramos, a lutar pela sua vida. Ele dirige-se ao homem, acudindo por ajuda. Ele abre a mala do carro e tira uma corda. Encontram algo onde a prender, e ele oferece-se para salvar a rapariga.

“Tem calma, eu vou salvar-te” , grita numa voz suave e reconfortante, como a de um verdadeiro herói. Uma voz há muito não ouvida.

Ele consegue apanhá-la mesmo a tempo, salvando-a no último instante em que o ramo cedeu. Ela abraça-o em sinal de gratidão, ambos conseguem subir para a estrada, libertando toda a adrenalina que ainda restava depois deste incidente.

Quando ele repara que ela ia regressar para aquele lugar longínquo, ele agarra-a e olha-a nos olhos.

“Não posso esperar mais...”, diz.

“Não, por favor, não.”

“Eu tenho que to dizer.”

“Não!”

“Eu amo-te!”

“Mas, eu não!”

“Eu sei...”, responde ele.

“Não posso sentir aquilo que não sinto. Obrigada por me dares mais umas horas de vida.”

Com isto, ela afasta-se. Foi aí que o nosso herói se apercebeu – ou que, pelos menos, foi capaz de admitir pela primeira vez – que ele podia salvar-lhe a vida. Podia mesmo salvar o mundo. Mas o seu coração, a ele nunca iria pertencer. 

Viajaram pela noite dentro, até ao fim dos tempos.

Publicado em 27 de Junho de 2013

segunda-feira, 3 de outubro de 2005

Eclipse

Para o comum dos mortais que gosta de prestar atenção aos mais pequenos pormenores, será de estranhar o facto de eu estar a publicar um artigo a esta hora do dia. Não que seja alguma hora em especial, é apenas a hora de almoço. Contudo, é uma hora em que, num dia normal, eu estaria em qualquer outro sítio, menos aqui. Mas tudo isto é irrelevante. 

Hoje foi finalmente lançado o Item, um DVD que contém todos os videoclips da história dos New Order. Além disso, inclui também o documentário New Order Story, que até agora apenas tinha sido editado em VHS. 

Hoje foi também o dia em que a Lua ofuscou tudo. Acordei cedo pela manhã e liguei a TV, apenas para me deparar com críticas técnico-desportivas, profundamente falaciosas, dirigidas ao Sporting CP. Senti-me abruptamente obrigado a levantar-me da cama e a ir para o sótão, observar o "fenómeno" que é um pássaro sentado numa árvore a abanar os ramos. 

Minto, isso aconteceu umas horas mais tarde. Aquela hora era a hora do Eclipse. Um evento que esperava desde o último eclipse parcial, há uns anos atrás. Esqueci-me completamente disso, enquanto me afundava em questões existenciais da mais alta importância, ou pensava em coisas tão banais, que acabei mesmo por achar que não valia a pena debruçar-me sobre elas. Pouco importa. Lá acordei, e lá vi o fenómeno. Posso-vos dizer que nunca vi um sol tão azul.

Este eclipse apenas se irá repetir daqui a vinte e oito anos. Evento tão raro como o lançamento de outro DVD como o Item, ou de uma equipa do Sporting CP que jogue tão bem como o FC Porto do Mourinho. 

Até lá, continuarei a questionar-me sobre tudo e mais alguma coisa. Quando estiver nos meus quarentas, lá irei comprar o jornal que ofereça aqueles óculos escuros, para observar o próximo Eclipse em todo o seu esplendor.

Publicado em 26 de Junho de 2013

domingo, 25 de setembro de 2005

Os Jovens Não Gostam de F*der

Imagino o choque de um leitor que encontrasse este título numa livraria, ou numa notícia de jornal. Os factos são factos, Portugal é um dos países europeus com o maior número de pessoas infectadas com o VIH. O número de mães adolescentes tem vindo a aumentar, e os jovens iniciam a vida sexual cada vez mais cedo. Mas, factos são apenas factos, e a verdade é que o título está completamente certo.

Antes de passar à explicação que todos esperam, vou elucidar-vos com uma pequena lição de História. Na antiguidade, antes do surgimento do Cristianismo, era comum, em muitas religiões, usarem o sexo como uma maneira de entrarem em contacto com o divino. Por vezes, os grandes rituais religiosos resumiam-se a cenas de sexo, com o intuito de entrarem em êxtase e contactarem com Deus.

Para os gregos antigos, e durante grande parte do Império Romano, o sexo não tinha tabus. Era um acto natural, que todos nós devíamos desfrutar sempre que tivéssemos oportunidade. Mas tudo isto mudou quando surgiu a religião cristã, com todas as suas regras e imposições, e declarou o sexo sem finalidades reprodutivas, como um pecado. 

Isto, como é óbvio, assustou muita gente, mas também fez com que muitos daqueles que estavam interessados nos ideais cristãos, se desinteressassem. Para os respeitar, teriam que largar tudo o que era divertido na vida. Por isso, passámos de uma sociedade que adorava, idolatrava, divinizava, e não estranhava o sexo, para uma sociedade púdica, cheia de tabus, que continha o impulso sexual pelo máximo tempo possível. 

Tornámo-nos seres estranhos, com comportamentos que nada correspondem àquilo que se passa na Natureza. Por comportamentos estranhos, refiro-me ao celibato e à abstinência, já que qualquer tipo de sexo é cem por cento natural. Como Freud uma vez disse, "apenas não fazer sexo é que não é natural".

Após esta lição de História, podem já se ter esquecido do título. Podem ter mesmo questionado o que é que esta treta de gregos, deuses, e tarados sexuais, tem a ver com a cor do manto da Nossa Senhora. Esperem mais um pouco, estou quase a chegar lá. 

Por vivermos numa sociedade extremamente púdica, e por na década de 1960 termos sentido a necessidade de lutar contra o Sistema – não confundir com o Sistema de Dias da Cunha, esse fica para outro artigo –, é que decidimos acabar com todos os tabus em volta do sexo. Tornando-o, assim, acessível a tudo e a todos. 

Com a chegada das novas tecnologias, até deixámos de passar pela vergonha de irmos comprar pornografia a um quiosque, ou de arranjar alguém mais velho para a comprar por nós. O sexo está aí, à mão de semear. É só ter vontade para o procurar. 

Com toda esta informação, crianças, não jovens, mas sim crianças, têm fácil acesso a pornografia e a material erótico. Antes dos onze anos já sabem mais do que os pais sabiam quando tinham vinte e um. Como o mundo do sexo tornou-se num universo aberto, começam cedo a sentir a pressão para perder a virgindade. Essa pressão surge através do seu grupo de amigos, nas escolas, e por contacto com jovens de idade superior às suas.

Eles fazem-no por curiosidade, por pressão, e para não ficarem para trás. Começam a tentar gostar daquilo, e a fazer tudo o que vêem nos filmes. Não perdem tempo para conhecer o seu corpo, e o seu "eu" sexual. Vão logo para o acto. Transformam-no num hábito, numa rotina. Chegam mesmo a defender até à morte, a ideia de que gostam e de que têm muito prazer, quando na verdade não chegam a sentir qualquer tipo de satisfação.

Muitas vezes têm receio de se explorarem, e de procurar as suas verdadeiras necessidades sexuais. Eles fazem-no pelo mesmo motivo que fumam, e que bebem. Sentem-se especiais. Esquecem-se que perderam tudo o que é especial no sexo. Esquecem-se que não existe melhor sensação do que fazê-lo com a pessoa certa. Esquecem-se do contacto com o divino, do verdadeiro êxtase. 

Na sua contínua luta por uma popularidade sem importância, desperdiçam tudo aquilo que podiam ter. Mais tarde, talvez se apercebam do que desperdiçaram. Talvez arranjem maneira de o recuperar. Mas, enquanto são jovens, simplesmente aprendem a não gostar de f*der, pois não o fazem por gosto, mas apenas por obrigação.

Publicado em 24 de Junho de 2013

Escreve sobre o que sabes

Foi esta a frase que me veio à cabeça, poucos segundos antes de ter aberto esta página.

Tenho que me render à realidade. Apenas um ou outro artigo dos vinte e sete já publicados neste blogue, é que tem interesse. E mesmo essas pêras num cesto de maçãs, ainda têm alguns bichinhos que estragam grande parte do seu sabor.

Na desesperada tentativa de produzir mais uma pêra, veio-me esta frase à cabeça. Mas o que sei eu? Um homem, provavelmente alguém famoso, ou talvez um ser de ficção, que não faço a mínima quem tenha sido, uma vez disse: “Só sei, que nada sei.” 

Eu sou verdadeiramente um ignorante, e um inculto, no que toca a saber das coisas. O que elas são, para que servem e, para pior de todos os males, como se chamam. Atormenta-me uma situação no oitavo, ou no nono ano, em que não sabia se devia pôr o pacote de Um Bongo no papelão ou no coisinho das embalagens. Não é essa indecisão que me atormenta, aposto que a grande maioria das pessoas já passou por este dilema. O que me atormenta é o facto de me terem criticado negativamente por não o saber. 

Na altura, isso deixou-me mesmo muito irritado. Outro exemplo é o facto de, há poucos meses, ter descoberto que outra palavra para Lírio era Açucena. Ouvi essa palavra numa música da Sara Tavares e fui ver ao Dicionário o que queria dizer. Para meu espanto, algo que eu pensava ser desconhecido do público, era na verdade, cultura geral. 

Foi uma situação tão vergonhosa que é neste artigo que a confesso pela primeira vez: Eu não sabia o que eram Açucenas, até ter ouvido a palavra numa música, e a ter ido ver ao Dicionário. Mesmo após descobrir, alguns meses mais tarde, que essa mesma palavra tinha surgido num teste de CTV, e eu ignorei-a completamente. Ignorei-a, ou simplesmente não me interessei o suficiente para a ir procurar ao Dicionário. 

São gigantescos os exemplos de palavras que nunca passaram pelo meu ouvido, mas que pelos vistos toda a gente as conhecia. Bacorada, que só descobri que existia enquanto falava com um pessoal de Setúbal, é outro exemplo. Isso deixou-me a pensar que talvez fosse um regionalismo, mas na verdade, toda a gente a conhecia. Toda a gente, menos eu. 

Outro caso, já é muito antigo. Durante toda a minha infância aguardava por aqueles dias em que chegava a casa e a minha avó tinha feito letria, eu adorava aquilo, principalmente com canela. Os tempos foram passando, e o meu gosto por letria mantinha-se inalterado até que um dia, devia ter eu uns treze anos, vejo escrito no livro de português “aletria” e não “letria”, como seria de esperar. Perguntei à professora se seria algum erro, mas ela confirmou-me que era assim que se escrevia. 

Todo aquele tempo, todos aqueles sonhos, destroçados por um mísero A. Porque raio é que se chama aletria? "Ó mãe já fizeste a aletria!" Sou o único que acha isto extremamente estúpido?

Este artigo dava um romance, não tivesse eu que ir jantar, ou não achasse que não valeria a pena continuar a escrever. Pois, quanto maior isto for, menos gente o vai ler. 

Aí está uma questão para um próximo artigo: Porque raio os jovens de agora não têm paciência para ler um artigo com mais de cinco linhas, ou um livro com mais de cem páginas?

Mais uma vez termino sem um fim. Deixo-vos com as palavras de um velhote que tenho vindo a admirar: "E esta, hein?!" 

Publicado em 25 de Junho de 2013

terça-feira, 13 de setembro de 2005

Querido Diário

Sinto uma estranha sensação de déjà vu, talvez por ter tocado numa certa e determinada tecla, e todo o texto que tinha acabado de escrever tivesse desaparecido. Será que sonhei com isso tudo, ou foi isto apenas um empurrão do meu subconsciente, como se dissesse que aquilo não prestava para nada? Prefiro a segunda opção, pois não sinto aquela dor de cabeça que surge sempre, mal eu acabo de acordar.

Eu sei. O meu último artigo foi tão mau, que agora tenho que recorrer a ti, para te contar mais um daqueles dias entediantes, só para ver se me safo da crítica, embora esta seja praticamente inexistente. 

Não venhas agora com queixas, pois eu sei que a tua única razão de existência sou eu. Bem, pelo menos tu sabes porque existes. 

Hoje foi um daqueles dias, tu sabes, um daqueles dias completamente normais. Não fiz absolutamente nada com relevo suficiente para te contar a ti, ou a quem quer que seja. Vê se me lembras de encontrar um daqueles sítios onde passam cassetes VHS para DVD. Creio que a minha cassete do Em Busca do Vale Encantado IV não dura muito mais. 

Normalmente não me preocuparia, mas é aquela que tem a versão em Português que passou na RTP. Aquela em que o Littlefoot se chama Pezinho, e tu sabes melhor que eu, que essa versão nunca foi vendida. Enfim, mais um daqueles "must do" que só não ponho num post-it, pois isso não fica lá muito bem. Aliás, porque é que se chamam post-its? Qual é o nome em português? Hei-de pesquisar isso. Talvez mais tarde.

Finalmente acabei de ver o Em Busca do Vale Encantado XI. Tem alguma piada, mas está a unidades astronómicas de distância da qualidade do original, ou até mesmo da do IV, que para mim é a melhor de todas as sequelas. Já que falei nisso, ainda não descobri a outra palavra que se usa para dizer sequela, mas não te preocupes, a investigação ainda está em aberto.

Bem, depois deste pequeno devaneio, vou terminar esta tua "coisa". O nome não me vem à cabeça, mas artigo não me parece que seja. De qualquer forma, espero ter a sorte, ou o azar, de que ninguém que faça parte "deles" leia esta "coisa", se não, estou extremamente "coisado".

Continuação de uma "boa coisa".

P.S.: Meu Deus, estou bué formal. É o que faz passar este tempo todo em CAEs e isso. Já agora, não me apetece mesmo nada ir à inauguração das novas instalações da Windsor School, por isso não vou.

Publicado em 23 de Junho de 2013

domingo, 11 de setembro de 2005

11 de Setembro

No primeiro instante em que se depararem com este título, vão supor que este é mais um daqueles artigos que têm como objectivo esmiuçar as implicações dos atentados, e da campanha de Bush nos países Árabes. Estão redondamente enganados. 

O dia 11 de Setembro de 2001 foi dos melhores dias de férias que tive nos últimos anos. Na altura, estava de férias no Algarve, tradição entretanto interrompida, e este era o dia em que tinha combinado ir ao Zoomarine. Foi, sem exageros, a última vez que estive numa piscina. Foi um dia calmo, ao contrário de outras vezes, não consegui apanhar uma das bolas que os golfinhos atiraram para os espectadores, mas ainda consegui subir um escorrega de água, algo pouco natural, pois a sensação de queda livre não é das minhas preferidas.

Não me lembro muito bem do resto do dia. Quando penso em Zoomarine, vêm-me à cabeça imagens de todas as vezes que lá fui, e, para manter este artigo conciso, é melhor não referir nenhum acontecimento que não tenha ocorrido naquele dia em particular. 

Por volta das dezoito horas saímos do Zoomarine e decidimos parar no Algarve Shopping. Lá dentro, só me lembro de ir a uma Vobis ou Worten, ver um Gamepad para o meu PC. Estava com ideias de comprar um, e acabei por o fazer, meses mais tarde, pelo Natal.

Após desistir de comparar preços, saí da loja para ver o resto do centro comercial. Enquanto caminhava, vejo que o meu pai tinha parado em frente a uma loja com alguns televisores na montra, e que em frente dessa loja estava-se a concentrar uma carrada de gente. 

Disse à minha mãe que devia estar a dar futebol, e fui ver o que se passava. A CNN, a SIC, a RTP, a Sky News e até a TVI, estavam todas a mostrar imagens das Torres Gémeas. 

Antes dos atentados, eu pensava que se chamavam torres CNN, ou torres CN, pois vi isso num Atlas que tenho algures aqui em casa. Numa página desse Atlas eram comparados os prédios mais altos do Mundo, entre os quais se destacavam as Torres Gémeas do World Trade Center. 

As minhas memórias do resto do dia estão algo confusas. Só me lembro de não ter gostado de a RTP 2 não ter emitido um episódio da Sabrina. Fora isso, foi um dia muito bom para mim.

Compreendo que muita gente ficou arrasada com os eventos dessa terça-feira, já eu não me senti afectado de maneira alguma. Ainda hoje guardo com carinho as minhas recordações desse dia passado no Zoomarine.

Publicado em 20 de Junho de 2013

quarta-feira, 24 de agosto de 2005

Querido Diário

Passava pouco das duas da manhã da noite anterior. Como normalmente tem acontecido, dormir não era uma opção. Embora já me encontrasse de pijama, enrolado por entre os lençóis, mesmo após ter desistido de fazer zapping, o sono não aparecia. 

A vontade de esperar para ver Everwood não era lá muito grande. A RTP bem que podia passar esta série em horários decentes, mas essa escolha a mim não dizia respeito. Agora, vejo-me a pensar em que trafulha o Ephram ter-se-á metido. Sempre quero ver se ele vai ficar com a Amy, apesar do Colin ter acordado do coma. 

Tudo isto deixa-me meio dividido, já que o Colin foi o que teve o acidente, e que se viu privado pelo destino, de uns largos meses da sua adolescência. Mas, nem tudo está mal para os lados de Ephram. Lá apareceu a misteriosamente interessente irmã do Colin, talvez Ephram tenha alguma sorte, quem sabe? Eu não, pois já devia estar a dormir quando o episódio começou.

Eram duas da manhã, levantei-me e liguei a luz para ir à "estante" (Não é bem uma estante, mas que outro nome lhe posso dar? Armário sem portas e com uma gaveta?). Estava decidido em encontrar o CD da Lene Marlin, não me perguntes o nome pois agora não me ocorre. 

Após umas três olhadelas lá consegui encontrá-lo. Olhei para a capa de trás, procurando a Fight against the hours. Ela lá surgiu, a sorrir em oitavo lugar. Baixei-me para tirar o leitor de CDs da Sony da mesinha de cabeceira.

Sim, o da Sony. Eu sei que o da Denver custou sessenta euros, e está ali por usar, mas se estou sempre a carregar a bateria dele, aquilo vicia, e não posso dizer que este CD seja de mp3, já que até é mesmo o álbum original. 

Ainda me lembro, recebi-o pelo Natal. Não sei se no do ano anterior, se no de há dois anos. O que interessa é que apenas recentemente tenho prestado mais atenção a este álbum. 

Feito isto, coloquei o álbum dentro do leitor de CDs, desliguei a luz, e desloquei-me até à janela, porta, ou varanda, como lhe preferires chamar. Quase caí sem motivo. Estava com os dois pés perfeitamente assentes no chão, mas isto às vezes falha. Na verdade, não foi bem assim, ainda ouvi uns dez segundos da música deitado na cama, antes de me levantar para apagar a luz. 

Fast forward, e uns trinta segundos mais tarde, encontro-me deitado na cama, a pensar em ir para mais perto da luz da janela. Sentei-me no chão e encostei-me no canto. Olhei para a janela, porta, ou varanda, como lhe preferires chamar, como se pudesse ver através dos estores. Mesmo entreabertos, a menos que encostasse a minha fronha aos seus buracos, não conseguia ver nada.

Ouvi a música até ao fim. Desprovi-me de qualquer sentimentalismo. Voltei a ligar a luz, para poder guardar o álbum no seu lugar, e colocar o leitor de CDs na mesinha de cabeceira. Eu guardo-o por debaixo do vidro, por isso não é assim tão simples. Não queria deixar cair a minha Ahnk, ou o meu relógio Swatch, que parou a uma certa e determinada hora, num certo e determinado dia, que eu não faço a mínima quando foi, já que logo no segundo dia do meu décimo ano, a corrente partiu-se, e o relógio ficou incapacitado, sendo agora impossível usá-lo sem trocar de corrente, o que o estragaria, e muito, esteticamente falando, claro. 

Volto a desligar a luz, e deito-me pensando em coisas triviais. Eventualmente lá consigo adormecer, embora não saiba como, nem a que horas. 

Apesar de ter acordado várias vezes, apenas quando o último dos sonhos terminou, com direito a fim, e a cenas do próximo episódio – episódio esse, que talvez ainda seja mais controverso que o anterior, bom, pele menos já posso jogar damas –, é que me decidi por levantar. Embora ainda com a letra da música na minha cabeça, acordei por volta do meio-dia e vinte. 

Passaram-se dez horas das minhas férias. Férias essas que estão quase a terminar. Pergunto-te então a ti, não te falta fazer alguma coisa?


Publicado em 19 de Junho de 2013

Tesouro Perdido na Areia

Estava na praia da Torreira quando, aos pés da minha toalha, encontro uma folha de papel quadriculado, meio enterrada na areia. 

Não vi nada de especial nela, mas algo em mim estranhava o facto de uma folha de caderno se encontrar ali. Peguei nela, lá estava escrito um estranho poema, já muito apagado. Decidi passa-lo a limpo, e aqui traduzo aquilo que sou capaz de perceber, daquelas linhas de rabisco, vítimas do desgaste do tempo.

Não sou inútil,
Sou alguém,
Ou talvez ninguém
Quem? Anda à procura de algo
Ou que talvez encontrou algo
Algo como o amor
O amor de alguém
Ou de ninguém
Porque esse alguém não é alguém é,
Sonho? Apenas que é
o Idolatrado?

Autor: Anónimo

Publicado em 18 de Junho de 2013

domingo, 7 de agosto de 2005

O Êxtase de Santa Teresa

Êxtase de Santa Teresa de Bernini
Passavam algumas horas desde que Teresa assistiu ao pôr-do-sol, no topo da torre oeste do convento de S. Euclides na Áustria. Teresa repetia este ritual todos os dias. Todos os dias, fugia às constantes chamadas da Madre que anunciava a hora do jantar. 

Todos os dias, Teresa encantava-se com o maravilhoso espectáculo de cores proporcionado pela perfeita junção da grandiosa esfera celeste, com os longos prados de flores, que rodeavam o convento. 

Os campos brilhavam em sintonia com uma miríade de cores que, aos olhos dela, só podia ser atribuído a um acto divino. Contudo, Teresa sentia que lhe faltava algo. Há já algum tempo que se sentia estranha. Um desconhecido vazio atormentava o seu coração. 

Apesar de rodeada por toda aquela beleza, algo na sua escolha de servir o Senhor, e de dedicar todo o resto da sua vida mortal a Ele, purificando-se para ser a sua esposa perfeita, não a estava a agradar. O vazio crescia a cada dia que passava, mas, naquele dia, algo estava diferente. Este desconhecido vazio fazia-se acompanhar por um estranho prenúncio do que lhe estava prestes a acontecer.

Teresa estava no seu quarto. Tinha terminado as suas preces, quando decidiu ir um pouco à janela pedir inspiração para os seus sonhos, às estrelas que iluminavam o céu nocturno. Não à Lua, pois essa tinha desaparecido. Há dias que vinha a ser engolida pelo vazio da escuridão. Mas, apesar de tudo, Teresa sabia que a Lua apenas estava noutro local, e que hoje era dia de Lua Nova. O dia de um novo começo. 

O vazio tinha atingido o seu limite. Estava na hora de o preencher. E, com este pensamento, Teresa deitou-se. Cerrou os olhos, continuando a pressentir que algo estava prestes a acontecer.

Para um mero viajante, ver um convento daqueles no meio de um prado tão longínquo era algo estranho. No entanto, devido à sua fama era rapidamente ignorado. Não por ter má fama, mas por simplesmente ser um dado garantido. A menos que precisasse de um sítio para passar a noite, nenhum viajante lhe daria grande importância. Mas tudo isso ia mudar depois desta noite.

Passava pouco das três da manhã. Todo o convento estava silencioso. Todos dormiam. Até Teresa estava profundamente emergida num sonho onde via um mundo estranho governado por cavalos de metal com rodas, e cheio de gigantes cubos de vidro. No meio daquilo tudo, sentiu uma forte vontade de acordar. 

Ao abrir os olhos, viu que todo o seu quarto estava iluminado, como se fosse dia. Ignorou essa primeira impressão, até que a ideia lhe atingiu o mais profundo do seu subconsciente. Levantou-se da cama. À sua frente, a imagem que mudou toda a sua vida, e com ela, a História do convento de S. Euclides.

“Teresa”, disse a voz do ser iluminado que apareceu diante dela.

“Chegou a minha hora, Senhor?”

“Não, venho aqui para preencher o teu vazio. Já o sentes há algum tempo. Deus ouviu as tuas preces e enviou-me para te ajudar.”

Teresa, um pouco incrédula com a situação, esfregou os olhos para tentar acordar. Aquilo só podia ser um sonho, pensou. Mas nada aconteceu, o ser iluminado ainda se encontrava no seu quarto.

“E como pensas preencher o meu vazio?”

“Deus entregou-me esta lança para que possa satisfazer o teu mais íntimo desejo.”

Teresa não sabia o que pensar. Só quis fechar os olhos, rezar, e entregar-se à sua morte. O Anjo apontou para o seu ventre, e lançou a lança. Contudo, Teresa não sentiu o seu ventre a ser trespassado, mas sim a sua zona sagrada que reservara toda a sua vida para servir Deus, quando o momento fosse certo. 

O seu primeiro pensamento foi que a sua santidade e pureza estavam a ser violadas. Não. Violadas não. Abençoadas, por um servo do seu Senhor. A seu pedido, tal como ele lhe tinha dito, para satisfazer os seus desejos mais íntimos. E, quando finalmente se apercebeu, reparou que esses desejos estavam a ser mesmo realizados. 

O acto durou algum tempo. No fim, Teresa sentiu-se como que rejuvenescida. O seu vazio tinha sido preenchido, e logo por um ser iluminado. Um Anjo, um servo do seu Deus. 

Teresa levantou-se para o agradecer, mas já ele tinha partido. Voltou a deitar-se, e deixou-se adormecer.

Na manhã seguinte, Teresa contou o seu encontro à Madre. Duvidando do seu testemunho, a Madre decidiu viajar com Teresa até ao Vaticano para confidenciar o "milagre" a alguém capaz de o compreender. 

O êxtase de Santa Teresa, tornou-se um dos contos obscuros escondidos pela Igreja. Bernini revelou-o numa escultura, aquela que acompanha este conto, e que eu agora vos revelo. Embora com muitos dados alterados para o bem da ficção, esta história conta na sua mais pura semelhança, o encontro de Santa Teresa com o Anjo que mudou a sua vida, e que preencheu o seu vazio.

Publicado em 17 de Junho de 2013

quarta-feira, 3 de agosto de 2005

A Resposta

Sim, eu tenho a resposta à pergunta que atormentou a Humanidade durante milénios. Quem apareceu primeiro, a galinha ou o ovo? Se usarmos a mais pequena parte do nosso cérebro, vemos que a resposta é mesmo óbvia: O Ovo!

Os leigos poderão argumentar que isto tudo é muito ambíguo. Apesar de a galinha nascer do ovo, é preciso uma galinha para pôr o ovo. Ora, é aqui onde todos se enganam, e onde eu, como Voz da Razão, vos passo agora a explicar o porquê de ser o Ovo o primeiro.

A resposta encontra-se numa pequena coisa a que eu gosto de chamar evolução. De facto, a galinha nasce do ovo e põe ovos de onde nascem galinhas, mas, a primeira galinha a aparecer não pode ter nascido de um ovo posto por outra galinha. Nasceu sim de um ovo posto por outro tipo de ave, muito semelhante a uma galinha.

Devido a uma estranha combinação genética dos progenitores, ou por causa de alguma mutação que simplesmente aconteceu por acção do meio – não sou capaz de responder ao certo – o embrião que se formou dentro desse ovo, transformou-se numa galinha.

A verdade é que o primeiro ovo, de onde nasceu a primeira galinha, foi posto por outra ave qualquer. Daí, quem surgiu primeiro foi o Ovo.

Publicado em 16 de Junho de 2013

segunda-feira, 1 de agosto de 2005

Um ano

Não, não é o meu aniversário, nem algo do género. Aliás, o dia 1 de Agosto do ano passado não deve ter sido muito diferente do dia 1 de Agosto deste ano. Mas a verdade é que já passou um ano, e tenho a certeza que hoje, o meu estado de espírito é diferente. 

Há pouco mais de um ano atrás, em pleno Verão, entrei num Outono que, por enquanto, ainda não se decidiu transformar em Primavera. Não sei se já é Inverno, ou se voltou a transformar-se em Verão, mas isso também é o menos importante. 

Ainda há pouco menos de cinco minutos, li um artigo num blogue que encontrei na página principal dos blogues do Sapo (já agora, foi este: A Felina Romantika). O que encontrei lá escrito, não posso negar, é algo que muito queria poder ter escrito em vários momentos da minha vida. Contudo, não o escrevi. Não por falta de tinta, vontade, papel, ou blogue, mas porque simplesmente não posso escrever, pois nada daquilo me aconteceu. 


Não por me afastar, pois o sentimento de não desistir é realmente algo que me persegue, e do qual eu me apercebo. Muitas vezes descrito como mais um defeito do que outra coisa, é algo que me é inato e imutável: Sou um Romântico e não posso fazer nada acerca disso, nem o quero fazer. 

Se, talvez, tivesse tentado a aproximação em alguns casos que, ultimamente me atormentam, não só em sonhos, mas também surgindo escondidos no meio das multidões, talvez tivesse conseguido o mesmo que a autora desse blogue. Apesar de tudo em mim me dizer o contrário, e de eu acreditar "neles". Aliás, até posso dizer que consegui uma aproximação semelhante com um dos casos mais recentes – eu tenho cá um jeito para tornar isto o mais sintético e técnico possível, não tenho? Faz parte da minha natureza formal. A culpa é do Inglês. 

Continuo ainda com esse receio, agora alimentado por uma incerteza, e uma sensação extrema de que, simplesmente, não vale a pena. Aquilo que penso que sinto, não é realmente o que sinto. Mas será isto assim ou será apenas uma barreira, falta de coragem, ou simples preguiça de fazer aquilo que já devia ter feito, há muito tempo? Pois, não sei. Só sei que tenho tentado ganhar toda a coragem possível. No entanto, acabo sempre por desistir, pois, apesar de tudo, continuo sem compreender nada, e sem saber o que fazer. 

Não sei ler os sinais, não sei ver se eles existem ou não. Só sei que me vejo assolado por uma vontade extrema de não tomar iniciativa, por vezes chegando mesmo a procurar outra saída, mais segura, mas que talvez não me dê aquilo que quero. Mas o que quero eu? Isto? Aquilo? Ela? Mas, porquê? Não sei. Apenas queria que ela me desse uma hipótese de o descobrir. 

Tudo em mim me diz que ela não ma dará. Mais vale, então, dispensar o embaraço e ficar "na minha" como se costuma dizer. Claro, depois terei que sofrer e aguentar com os "e se", e acreditem, já ando a aguentar com estes "e se" há tempo demais. Falta-me coragem para dizer aquela frase. 

Para quem tem medo de morrer, viver é ainda muito mais assustador.

Com isto tudo, não me quero queixar, nem soar lamechas, mas a verdade é que as coisas não são assim tão simples, apesar de o poderem ser. Já tenho demasiados fantasmas no armário. Mais vale arranjar essa coragem, que de corajosa não tem nada, pois as probabilidades indicam que o fracasso e a humilhação são o pão das apostas. 

Tentarei arranjar essa coragem sem me deixar cair em ilusões, aliás, já estou demasiado ferido e assustado para que mais uma coisa destas me doa. 

Retomando o assunto, apesar de tudo, ainda não saí do Outono em que me puseram há um ano atrás. Mas também não posso dizer que é mau de todo. A cor das folhas serve de adereço aos muitos sonhos, e o calor das casas, e das pessoas, é sempre um abrigo bem desejado. 

Com mais um daqueles artigos de possível melancolia sentimental vos deixo. Espero que não se fartem deles.

Publicado em 13 de Junho de 2013