domingo, 3 de dezembro de 2006

X

Agora durmo,
Numa imensidão do teu antes.
Daquilo que nunca foi,
De ti, que nunca serás.

Agora durmo,
Perdido num limbo de nada.
Nas memórias de algo,
Que não existe, nem existiu.

Agora durmo.
Penso em motivos,
Perdidos no seu tempo,
Escondidos para sempre de ti.

Agora durmo,
Porque não me deixaste acordar.

Publicado em 29 de Julho de 2013

sábado, 22 de julho de 2006

Screaming into the Dark

Quantos dias teriam passado? Que luz era aquela que lhe encadeava os olhos? Alguém podia saber, mas ele já não tomava conta dos dias, nem tão pouco se importava com o que se passava à sua volta, mesmo que esta luz lhe doe-se como se as suas Íris estivessem a arder.

Hoje não seria um dia diferente, apenas mais um dia daqueles que vieram a seguir ao impensável. Mas ontem houve algo diferente, um simples telefonema, que não fosse pela persistência da chamada, nunca teria sido atendido. A voz do outro lado apanhou a sua atenção. Seria mais um palhaço a tentar enchê-lo de propaganda enganosa? 

Desta vez não. A voz era familiar, alguém do passado, alguém que tinha boas notícias, coisa rara por estas bandas. Apesar do cepticismo ele concordou em encontrar-se com a voz. Mal se apercebeu de que a luz era a de mais uma amanhã, a manhã do dia seguinte, do dia que tinha algo para fazer. Despertou, e preparou-se para ir ao seu encontro.

Ainda era de manhã quando se encontraram. Já tinha passado alguns anos desde a última vez que se viram, mas qualquer sentimentalismo, ou saudade, eram coisas que não podiam ser associadas a este momento. A voz pertencia ao seu filho.

“Vem. Descobri uma maneira de a salvar.”

“Foi para isso que me chamaste? Não tenho tempo para parvoíces.”

Virou as costas para se afastar, mas parou quando sentiu o seu braço a ser agarrado, puxando-o para trás.

“Se fossem parvoíces não te teria chamado!”

Ele viu nos seus olhos que ele dizia a verdade. 

Entraram ambos num armazém, ao fundo estava uma estrutura metalizada oval, com uma cadeira no centro, como uma espécie de cápsula.

“Entra lá dentro”, disse o seu filho.

“O que vai acontecer?”

“Consegui fazê-lo, posso levar-te ao momento antes...”

“‘Tás à espera que acredite que aquilo é capaz de contrariar as leis do tempo e do próprio destino?!”

“Do destino, só cabe a ti descobri-lo, mas do tempo sim. Agora, entras lá dentro ou vais continuar a desperdiçar o resto da tua vida?”

“Hmm... Sempre foste muito teimoso...”

Ele entrou na estranha cápsula, apesar de continuar céptico, uma pequena onda de esperança começava a formar-se dentro dele. Depois do seu filho accionar o mecanismo inicial, e de lhe explicar o que tinha de fazer, a cápsula fechou-se e ele adormeceu.

Alguém sabe o que é perder um verdadeiro amor? Talvez ninguém, mas ele sabia-o. Tudo aconteceu há uns meses atrás. Ou já seriam anos? Pouco importa, a data precisa perdeu-se nos fios do tempo. Numa fresca noite primaveril, passeavam pela floresta, nada havia a temer. Já o tinham feito muitas vezes, mas algo estava diferente, ele não se sentia ele, todo o seu poder tinha desaparecido. Sentia-se normal, mas estando ela ali, não havia tempo para pensar nisso. 

Aquela noite foi mesmo muito diferente. Da escuridão surgiram algumas sombras que sem aviso ou qualquer tipo de motivo decidiram atacar. Eles fugiram até onde puderam, mas as sombras encurralaram-nos. Ele tentou lutar, mas eram meras sombras, e ele sentia-se muito enfraquecido como nunca antes se tinha sentido. 

Três foram as flechas que trespassaram o peito da sua companheira, que ali jazia apenas com forças para um último olhar. Com isto o seu poder retornou, mil vezes aumentado pela raiva, e pela dor. Com facilidade derrotou as sombras, mas porque é que o seu poder se tinha dissipado? Porque tinha ela de morrer? Chegou o dia de obter a resposta a estas perguntas.

A cápsula finalmente chegou ao seu destino. Despertou, quando ela se abriu. Olhou para as horas, já faltava pouco tempo, tinha que se despachar. Estava na mesma floresta, exactamente como se lembrava. Decidiu antecipar-se e procurou o local onde eles tinham sido encurralados. Lá, esperou que eles chegassem. Um movimento chamou a sua atenção, pouco tempo depois. Lá estavam eles, e lá estavam as sombras. 

Concentrando todo o seu poder dirigiu um jacto de energia destruindo todas as sombras. Mas as flechas já tinham sido lançadas. Só havia uma coisa a fazer. O último sacrifício por quem ele amava. Colocou-se a si próprio em frente delas e assim foi ele atingido em vez dela. Logo ali desapareceu. O universo inteiro rodou na outra direcção. O destino e a vida de ambos voltou ao normal, como se o encontro das sombras nunca tivesse acontecido.

O sacrifício de alguém que morreu naquele dia, culminou na sua verdadeira morte. Era o que tinha a fazer. Ele podia já não existir, mas o seu outro Eu, que não passa dele mesmo, esse nunca terá que passar por aquilo. 

O seu filho talvez soubesse que era assim que as coisas se viriam a desenrolar, mas nem ele próprio guardou memórias do herói que o seu pai nunca foi. Esta amostra de verdadeiro amor ficou perdida no tempo. Esquecida para sempre, mas eternamente viva nas vidas que foram salvas naquele dia, e nos destinos que se alteraram.

Publicado em 13 de Agosto de 2013

segunda-feira, 17 de abril de 2006

Last Shred of Hope

Imagem DR
O bando já vagueava pelo deserto há semanas. Pouco alimento foram encontrando pelo caminho. Exaustos e famintos, aquele precioso oásis de salvação tardava em surgir no horizonte. Tudo começou com uma visão que o Deyn tinha tido semanas antes. "Em breve o céu cairá, e com ele o nosso império. Nada nos irá salvar, excepto o vale etéreo." Deyn era conhecido pelas suas visões que até agora sempre se tinham concretizado. Esta indicava-lhe o caminho para um vale perdido nas histórias do caminho. O único local onde podiam refugiar-se. Mal sabiam eles, que o tempo era cada vez mais escasso.

Deyn viajava com o seu irmão, Nick, a quem os outros olhavam como líder. Os outros eram apenas três, a Berry, o Vin e a May. Os cinco pertenciam a um grupo ainda maior, mas muitos não acreditaram na visão de Deyn, e optaram por não os seguir. 

Já não avistavam ninguém há dias, nenhuma presa se atravessou no seu caminho. Eles têm uma grande capacidade para se sustentarem por longos períodos sem alimento, mas o calor intenso e o cansaço da viagem, já fazem das suas. 

Ao longe, Nick avistou algo que se parecia com um pequeno lago. Pediu a Vin que fosse com ele investigar e disse aos outros para ficarem à espera. O pequeno lago, que de lago tinha pouco, ainda tinha alguns peixes. Apesar de não ter muita experiência, Nick ficou para trás para tentar pescar alguns, e enviou o Vin para trazer os outros de volta. 

Muito desastrosamente lá conseguiu pescar alguns peixes, e preparar o jantar para o resto do bando. Ali descansaram até ao anoitecer. O frio da noite obriga-os a mexerem-se. Sob o abrigo da noite, fazem melhor caminho. Protegidos daquele tórrido sol, que os atrasa constantemente. Mas a noite pode esconder muitos perigos. Nunca se sabe quando algo maior que nós nos pode atacar. Nick esforça-se para manter o grupo junto, enquanto procura seguir o caminho, o mais cuidadosamente possível.

Os dias passavam. O fim cada vez mais próximo, e o seu destino continuava a parecer estar tão longe. Já eram capazes de avistar os picos que rodeavam o vale. Atravessá-los será difícil, se não mesmo impossível, mas por enquanto têm outras preocupações. Na noite anterior avistaram alguns Tarbos. Nick receia que eles também os tenham avistado a eles. A noite poderá trazer problemas. 

O bando continua unido, mas o cansaço e o medo de uma morte dolorosa abate os seus espíritos. Nick, faz tudo para os conseguir moralizar. "Já falta pouco, percorremos este caminho todo, não vamos desistir agora." Era isto que eles viam no seu olhar, e no seu apoio. Com ele tinham a certeza que chegariam ao seu destino.

O Vale em si, era um mero mito, contado de geração em geração. Um local de refúgio. Intocável. Estagnado no tempo. Mas a verdade é que existia mesmo, apenas nunca houve motivo para lá chegar, nunca, até à visão de Deyn.

Deyn acordou sobressaltado, era Berry, estava na altura de eles partirem. Era difícil de dizer ao certo aquilo que havia entre Deyn e Berry, uma espécie de ligação, que a fez confiar nele e nas suas visões desde o início. Deyn encontrava conforto nela. Berry era a sua réstia de esperança neste mundo que parecia tê-la perdido. 

Os dois juntaram-se ao resto do bando e seguiram caminho. Alguns quilómetros à frente, Nick parou de andar, disse a Deyn e Vin que ficassem com ele, Berry e May esconderam-se por detrás de uns arbustos. Nick tinha "tropeçado" numa pegada de um Tarbos. Eles estavam perto, podia ser perigoso seguir em frente, mas ainda muito mais seria se ficassem por ali. 

Podiam dar a volta na tentativa de os despistar, mas isso iria atrasá-los pelo menos meio-dia, e o tempo escasseava a uma velocidade que eles nem imaginavam. Nick não tinha outra opção, era preciso agir. O grupo continuou em frente, tomando todas as cautelas possíveis. Mas nem o mais cuidadoso dos seres era capaz de prever o que iria acontecer. 

Do nada, dois Tarbos surgiram pelo flanco do grupo. Os cinco juntaram-se o mais que puderam, tentando procurar uma oportunidade para fugirem. Os dois Tarbos circundavam-nos. Podia ser difícil, mas estes dois não iriam ter vida fácil, pensou Nick para si próprio. O grupo estava assustado, poucas forças lhes restavam. 

Nick atirou-se a um dos Tarbos, apanhando-o desprevenido. Deyn e Vin tentaram tratar do outro, mas o Tarbos derrubou o Vin. Deyn distrai-o e faz com que ele o persiga. Deyn é mais ágil e mais rápido, mas quando parecia que ia conseguir escapar, tropeçou numa rocha e caiu atrapalhadamente no chão. 

O Tarbos alcança-o e prepara-se para investir o golpe final. Deyn vê a sua vida a passar em frente dos seus olhos, esta era uma visão menos dolorosa que as anteriores. As várias imagens da Berry faziam-no esquecer o terrível destino que o esperava. Quando se apercebe que o Tarbos estava a demorar o seu tempo. Ao abrir os olhos vê uma cena muito pior que um pesadelo, o Tarbos perseguia a Berry que tinha vindo em seu socorro. 

Enfurecido com a situação, Deyn corre atrás do Tarbos alcançando-o e pregando-lhe uma rasteira. Este cai estatelado no chão. Para a sorte dos dois, este Tarbos não se irá levantar tão cedo. Mais à frente, May ajuda o Nick a afugentar o outro Tarbos. Esta não seria uma refeição fácil, e com a queda do seu companheiro, não valia a pena gastar mais energia.

Após esta aventura, à qual ninguém sabia como conseguiu escapar vivo e inteiro, os cinco juntaram-se em desespero. Caminhavam há semanas, estavam famintos e não conseguiram encontrar o vale. Até que May chama a atenção dos outros para um pequeno riacho que penetrava nas montanhas à sua frente. Nick achou que o deviam seguir. Seguiram o riacho, que se tornou num rio, cujas margens se alargavam à medida que o percorriam. 

Os dias passavam e este rio parecia não ter fim, até que uma noite, a escuridão do horizonte iluminou-se. No céu, tal como um mensageiro divino, uma estrela luzia mais do que as outras, quase tanto como a Lua. Foi pelo espanto dos outros que Deyn reparou no que essa estrela iluminava. À sua frente estava uma queda de água, que desaguava num vale luxuriante. Igual àquele descrito na sua visão. Os cinco juntaram-se em alegria. Finalmente encontraram a terra prometida. Um refúgio para se protegerem do fim dos tempos, da queda do seu império.

Essa estrela era um asteróide com mais de dez quilómetros de diâmetro, que caiu no outro lado do mundo. A sua queda, conjugada com uma série de eventos, escureceram a Terra e provocaram a morte de mais de 70% das espécies. 

Foi assim que chegou ao fim o reinado dos Dinossauros, mas não para todos. Os cinco Deynonychus e os demais refugiados do vale, sobreviveram. A sua história, perdida no tear do tempo, juntamente com eles, e a localização desse vale, continua a ser contada nesse local longínquo, onde o tempo parou. E onde Nick, Deyn, Vin, Berry e May puderam gozar os últimos anos da sua existência.

Publicado em 8 de Agosto de 2013

sábado, 25 de março de 2006

Shouting in the Nothingness

Imagem DR
Era de manhã. Não havia antes, nem necessidade de o tratar como antes. O Sol já ia alto, bem acima das nuvens. Tão alto que cá em baixo, apenas o cinzento da luz ofusca se reflectia no ar carregado do horizonte.

Mais um dia nublado. O início de uma Primavera normal, como sempre foi. Nenhum antes para sentir falta de. Apenas um dia como todos os outros. Mas, como todos os dias normais, este não seria escrito se não fosse algo mais do que apenas isso. Com nada em particular para fazer, parto para o sítio do costume, onde nada em particular se iria passar. Não num dia tão normal como este.

Dava-me como concretizado, ao conseguir encontrar alegria num dia cinzento. Passando assim a pertencer a um grupo restrito, daqueles que são capazes de o fazer.

Ao subir as escadas, nada para além da normalidade. Normalidade de degraus. Incontáveis. Permanentes e passados. Mantêm uma eterna indiferença rochosa perante tudo aquilo que por eles passa.

Continuo até ao topo. Caminho para aquele local, onde lá estarei, para me banhar pela normalidade que absorve este dia. Que dias normais, esses passados, subindo e descendo degraus, caminhando por passeios e estradas, sobre as quais outros passavam. Outros que seguiam as suas rotinas, procurando o mesmo propósito de uma busca pela normalidade.

Tudo isto ainda não era um antes, se alguma vez viria a ser. Era aquilo que era. Era um agora. Um agora que não precisava de um antes. Que não sonhava em ser um antes, e que não precisava de um antes.

Todos estes caminhos assim continuam, até ao dia em que os agoras do presente se tornem nos antes do passado. Antes que perseguem estes presentes, não como ofertas, mas como aquilo que são: Lembranças de um antes que já foi um agora.

Caminhos férreos, acidentes, realidades, anjos, terraços, perigos, bicicletas e viagens, sempre viagens. E assim, todos os antes culminam num agora. Um agora incapaz de ser aceite. Um agora que não passa disso. Apenas um agora em toda a sua normalidade. Um agora que não teme nem anseia por um antes.

Porque tem algo de ser salvo? Porque tem algo que desaparecer? Porque tem algo de ser relembrado?

Perguntas vãs, com respostas sem sentido. Nem o nada sabe aquilo que é, ou que não é. Hoje é um dia normal. O dia da eterna e simplista nebulização, que nos acinzenta o caminho para a alegria.

Publicado em 5 de Agosto de 2013

sexta-feira, 10 de março de 2006

IX

O Futuro (título original)

Nevoeiro encoberto,
Longínquo Fervor.
Nada para temer,
Nenhum medo para ter.

Futuro, palavra indistinta.
Sem sentido, ou vontade.
Perfeita desnecessidade,
De uma missão extinta.

Longitude horizontal,
Cá num canto de Portugal.
Olhos de Europa perdida,
Futuro incerto, de uma morte desmedida.

Futuro deste, ou daquele.
De mim, ou de ninguém.
Que adianta procurar nele,
A inexistência de alguém?

Futuro, palavra maldita.
Sol de inverno porvir.
Primavera, daquela que foi bem dita.
Sem rumo, ou direcção, de onde partir.

Futuro, que te procura.
Quer-te, e tem-te.
Não há nada a fazer,
Apenas nada a temer.


Publicado em 24 de Julho de 2013

sábado, 18 de fevereiro de 2006

Aulas e mais aulas, e mais aulas...

Era uma vez, em tempos que já lá vão, D. João II estava sentado na sua corte, à direita de seu pai. Nessa manhã, Jesus tinha-lhe visitado com uma intimidação avisando que o ia processar por violação de direitos de autor.

Tal pouco afectou el-Rei, que até ficou maravilhado com a performance musical, que o Messias lhe presenciou. “Digna de Broadway”, pensou ele. Seja lá o que isso for, quando for inventado, pois ainda não o foi. Mas el-Rei lá sabe que o será.

Jesus não foi a sua única visita. Após o cenário ter sido levantado, Cristóvão Colombo veio pedir-lhe fundos para viajar em busca da Índia e um adiantamento do seu registo de nacionalidade Portuguesa, pois a Selecção tinha um compromisso muito importante com a futura selecção Brasileira, e ele era preciso para os escravizar antes que o Ronaldinho conseguisse chegar à área.

D. João II não gostou da conversa e mandou-o ir dar uma volta ao bilhar grande, seja lá isso o que for. Colombo partiu assim para as docas onde viu Vasco da Gama na conversa com o Infante D. Henrique. Planeavam uma maneira de jogar ao berlinde com cubos de vidro em vez de esferas. Colombo achou a ideia de génio, mas a ideia de ir para a Índia de Nau, ainda lhe agradou mais.

Estando os dados lançados, Vasco da Gama partiu para a Índia e Colombo pediu um táxi para o seguir, pagando 15 euros, seja lá o que isso for, pela boleia das docas até ao mar. Lá construiu uma Nau com os pinheiros do pinhal de Leiria, que estavam, convenientemente, por ali ao acaso. Colombo terminou a construção da Nau e partiu no encalço de Vasco da Gama, que já lhe levava algumas milhas de avanço. Dias foram-se passando, até que num dia de nevoeiro denso, onde anos mais tarde D. Sebastião se irá perder, Colombo optou por virar à direita acabando por atingir uma terra desconhecida, chamada Brasil, que este pensou ser a Índia. Mal chegou, entrou em contacto com os locais.

“Então isto é que é a Índia?”

“Não cara! Isto é o Brasil, a Índia fica pra aquele lado.”

“Hmm... Quem sois vós?”

“Eu sou o Sexta-Feira, não sei o que faço aqui. Este cara aqui é o Mindão, foi ele que subjectivamente me ensinou a falar assim, sabe...”

Deparado com uma figura que não se parecia com nada, Colombo assustou-se e voltou para Portugal, entrando no Estádio da Luz para pedir ao Luís Filipe Vieira que abanasse as orelhas e que pedisse ao Bin Laden para lhe emprestar antraz para ele poder conquistar a terra desconhecida chamada Brasil. Mas, pobre coitado, Colombo teve que se contentar com umas gripes e uns sarampos.

Do outro lado do mundo, Vasco da Gama já tinha chegado a Moçambique, onde contratou o Eusébio para o Sporting, e teve uma longa conversa com Sexta-Feira (que tinha apanhado um voo da TAP no dia anterior) sobre o seu novo jogo de berlindes. Sexta-Feira achou a ideia interessante, e até lhe indicou o resto do caminho que Vasco da Gama ainda tinha que fazer para chegar à Índia.

Despedindo-se de Sexta-Feira, e com o Eusébio a bordo, Vasco da Gama partiu em busca da Índia, passando o caminho todo a falar do encontro com o Mostrengo, e da maneira com que ele conseguiu convencer o mesmo a baixar as suas expectativas. Aproveitando um momento de maior emoção para lhe espetar com a pontinha da Nau no olho, fazendo-o contorcer em dor, enquanto Vasco, Jesus, os sete anões, Camões, e a miúda do gás, fugiam para a segurança do mar aberto.

Passaram-se meses e até mesmo dias. Quando Vasco da Gama finalmente encontrou a Índia, lá estava o Sexta-Feira à beira de uma placa que dizia Bem-Vindo em 7 línguas diferentes. Vasco da Gama cumprimentou o amigo e foi ao Modelo mais próximo comprar especiarias e umas pilhas AAA para o comando da televisão de el-Rei.

Apesar da oferta de Sexta-Feira lhes dar boleia no seu tapete mágico, Vasco e os 12 magníficos seguiram viagem de regresso a Portugal, onde, à chegada, lembraram-se que se tinham esquecido do passe internacional do Eusébio, obrigando este a ficar 462 anos à espera na alfândega. Tragédia que acabou com ele a tornar-se no novo reforço do Benfica.

E foi assim que naquele dia Sexta-Feira inventou o jogo do berlinde, aparando os cubos e transformando-os em esferas.

Fim.

Publicado em 31 de Julho de 2013

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2006

Baby, can you dig your man?

Foto DR
E desta forma o mundo acabou.

Por vezes gostava de me sentir como o Larry Underwood, a caminhar num mundo destroçado, coberto por desertos e mortos. Acompanhado apenas por um pontual oásis de vida humana, avistado de quando em vez.

A verdade é que não saberia como sobreviver. Neste mundo, não foram poucas as vezes que me senti desta forma, mas, pelo menos, sempre tinha comida fresca na mesa. Um carro atestado e com a revisão em dia. E pouca, ou nenhuma, necessidade de temer os estranhos que passavam pela rua. Apenas em tempos de escassez podemos ver o quanto especiais verdadeiramente somos.

De qualquer das maneiras, à mínima ferida mais grave, ver-me-ia condenado. Será que valeria a pena ser um dos poucos sobreviventes do apocalipse? Talvez finalmente encontrasse assim alguma paz. Talvez a morte não seja assim tão má. Não sei. Também não sei se faria como os outros, e iria em busca de vida humana. Já hoje pouco a procuro, embora, por vezes, deseje alguma da sua diversidade.

A verdade é que nestas coisas não existe verdade. São meras hipóteses que, pouco provavelmente, algum dia virão a ter uma oportunidade de serem provadas, ou contra-argumentadas.

Estar só no meio de uma multidão pode ser dos mais antigos clichés que nos vemos obrigados a ouvir, mas, contudo, não deixa de continuar a acontecer.

Estarei realmente só? Não, mas gosto de pensar que sim. Estranho sentimento de self-pity que provavelmente nunca irei compreender.

A verdade é que não existe nenhuma verdade, nem tão pouco uma mentira. As coisas são como são. Eu sou como sou. Não estou só, mas anseio por me sentir assim. Só quero aquilo que não posso ter, e só preciso daquilo que não quero. Um paradoxo ambulante. O meu dogma. A minha cruz. Estas palavras já não fazem sentido, nem tão pouco era essa a minha intenção.

Acredito que seria um sobrevivente. Não me imagino morto, logo serei imortal. Tal pensamento egocêntrico talvez nunca venha a ser provado. Mas irei comprovar algo, alguma vez? Vou continuar a celebrar aquilo que nunca irei ter?

Perguntas lançadas no ar, que sem resposta vão permanecer. Isto de ser eu não tem muita piada, ou talvez as coisas não sejam assim. A verdade é que nem sei o que estou a escrever, nem o porquê de o estar a fazer.

Escrever sem sentido faz-te dizer coisas que podem ficar confusas. Mas todo o caos tem a sua ordem. Não é preciso procurar muito para a encontrar. Ela é tão explícita como a beleza interior.

Não espero por interpretações, nem por possíveis intervenções. Essas simplesmente não existem. Isto é o que é. Eu sou o que sou. E por enquanto ficarei por aqui. Tanto para dizer, tão pouco tempo para o fazer, tão poucas razões também.

Publicado em 28 de Julho de 2013

sexta-feira, 20 de janeiro de 2006

Sonhos de Sofá

Foto DR
“Aconselho-te a apressares-te. Esta velocidade pode ser imprópria para cardíacos.” Ariel, não, não era este o seu nome, mas bem que podia ser. A tal senhora de branco ascendia no céu até pairar em pleno ar. Que movimento indescritível, e cheio de tão tremenda beleza. Beleza essa coberta por uma sombra.

Ele estava lá em baixo, controlava-a contra a sua vontade. Ela aponta a sua flecha para os inocentes. Eles nada lhe fizeram, nem a ela, nem a ele. Mas é a ele que Ariel obedece. "Tem que ser agora", diz-lhe sem mexer os lábios.

Ela está relutante, incapaz. Porque tem ela de dar tal destino aos inocentes? Porque deve tamanha pureza e serenidade, ser sujeita a esta opressão? A tamanha demanda pelo inaceitável? Pelo perverso?

Ariel, identifica o seu alvo e puxa a flecha para trás. "Isso. É agora!", grita ele. Sim, é agora, ela sabe que não é capaz. Não disto. Mas existe algo que ela ainda pode fazer: Pôr um fim à sua opressão.

Ela direcciona a sua mira para o coração daquele ser perverso. Com alvo no centro da sua perversidade, a traição abate-se sobre os céus, e a seta trespassa-o. Ariel nem pestaneja, há mais vidas a salvar.

O Eu que, de tantas adversidades, e problemas impossíveis, vê-se mais uma vez numa situação de perigo irrealista e surreal. "Porque raio estas coisas só acontecem a mim?! Que sonho tive eu tão desastroso que acabou com o universo de outrem?".

A caminho do calor reconfortante daquela que um dia o salvou de si mesmo, a sua bicicleta pára. Também os grandes heróis são amigos do ambiente. À sua frente, algo que desde criança ele aprendeu a familiarizar e a conhecer melhor que ninguém.

Este não tem quaisquer exageros cinematográficos. Doze metros da cabeça à ponta da cauda. Dentes e mais dentes. Braços curtinhos com apenas dois dedos, mas de cor negra. Muito negra.

O T-Rex olhava-o. Nada havia a fazer. Não era capaz de pedalar mais depressa. Este seria o fim. Não existiam realidades generosas, ou salvamentos de última hora. Não desta vez. Desta vez, era o fim.

Mas Ariel não podia deixar que assim fosse. Afinal tudo isto era obra do seu mestre que agora jaz morto numa poça da sua própria malvadez. Do céu deixa cair o salvador. Não aquele que se esperava, mas outro da mesma espécie. Mais pequeno, decerto. As apostas não estão do seu lado.

A clareza do bem é translúcida na sua pele, e na sua leve penugem branca. O T-Rex maior recupera os sentidos. Atordoado após testemunhar um da sua espécie a cair dos céus. Ignorando Ariel, e o nosso herói, ele olha nos olhos do recém-chegado.

Antes de fugir desenfreadamente estrada fora. Este Eu seria capaz de jurar que o tinha visto a sorrir.

A luta começou. Ariel é incapaz de a ver. O seu tempo não pode ser preenchido por estas coisas mundanas. Ela cometeu o único acto imperdoável, mesmo que apenas o bem possa surgir da sua traição.

Terá agora que responder perante um poder maior. Um poder que transcende qualquer um, até inclusive, os poderes do Eu que morreu em seu desespero.

A luta interminável entre dois membros de uma espécie extinta continua a ser disputada por baixo do olhar de Ariel. Ao nosso Eu apenas resta o reconforto de algo a que pode chamar de casa.

Este é o seu mundo. Este é o seu dom. Esta é a sua maldição.

Publicado em 23 de Julho de 2013

domingo, 15 de janeiro de 2006

VIII

Olha-me nos olhos (título original)

Olha-me nos olhos.
Vê aquilo que te quero dizer.
Não procures nas entrelinhas,
Do que costumo fazer.

Olha-me nos olhos.
Vê aquilo que sinto.
Penetra no meu âmago,
Procura a minha inocência.

Olha-me nos olhos.
Diz-me o que vês.
Não negues aquilo que já sabes,
Di-lo de vez.

Olha-me nos olhos.
Dilacera-os se necessário.
Procura lá dentro,
O teu, e único, presságio.

Olha-me nos olhos.
Já encontraste a resposta.
Agora di-la.
Transforma-a nas tuas palavras.

Elas não magoam,
Quando servem para salvar.
Tu sabes qual a sua verdadeira função,
Agora segue o teu coração.

Olha-me nos olhos,
Diz-mo sem hesitação.

Publicado em 22 de Julho de 2013

Escrever

Ser escritor não é tarefa fácil. A maioria tem a ideia do sujeito preguiçoso que passa o dia de pijama e roupão, e que de vez em quando lá se senta na secretária a digitar algumas frases. Mas a verdade não é bem assim. 

Cada escritor tem o seu momento, aquele em que as musas ou as ninfas lá lhe vêm fazer cócegas e o deixam flutuar até perto de um papel, ou de um teclado, e deitam um feitiço sobre os seus dedos, para que algo se forme, cresça e ganhe vida. Nem sempre por esta ordem. 

Mas esses seres ainda chegam a ser mais preguiçosos que a figura acima descrita. Podem passar anos a beber néctar, e a falar do tempo em elevadores que não saem do rés-do-chão. E enquanto eles lá ficam, o escritor tem que puxar pela sua imaginação, que nem sempre gosta de cooperar. 

Isto é tudo muito bonito, mas ainda não mostrou sinal de ser alguma espécie de trabalho árduo. Não se preocupem meus fieis defensores da classe laboral, os escritores também têm outros empregos. Empregos esses que por vezes ajudam-nos na contínua busca por ideias, se assim não fosse, não passaríamos de pobres coitados. 

Muito para além da parte financeira, é preciso dar tempo para voltar à figura inicial. O que fazer quando passamos o dia de pijama e não nos apetece ir à secretária escrever seja o que for? Bem, aí não há nada a fazer. Mais vale não escrever nada, do que escrever algo de qualidade inferior àquilo que somos capazes de produzir. Nem todos pensam assim, mas também temos de ter em conta os prazos que por vezes somos obrigados a cumprir. 

Mas e se o contrário acontecer? Se tivermos mil e uma ideias para encaixar numa só? Aí chegamos à situação em que me encontro. Sim, mais uma vez vou escrever um artigo completamente egocêntrico, mas se eu não me centro em mim, e nas coisas que me dizem respeito, quem o fará? 

Egocentrismo à parte, tentar escrever um romance é algo muito duro e complexo. É preciso procurar a personagem, ou personagens principais. Ter uma ideia para o seguimento do guião. Encontrar uma história, uma finalidade. E por fim, descobrir o melhor final para dar à história. 

Aqui surge-nos o momento crucial. Alguns peritos gostam de ser minuciosos. De traçar um plano e depois segui-lo. Outros preferem ser espontâneos, embora isso nem sempre resulte. Também depende daquilo que queremos fazer da obra. Seja publicá-la, ou simplesmente ficar com ela para nosso proveito pessoal. Ou até mesmo queimá-la como um desastre, um completo aborto literário que apenas as massas inconscientes seriam capazes de adorar. 

Ah, como elas adorariam. Seguir-te-iam cegamente até aos limites do precipício, pois é isso que elas fazem. Mas se tu não o farias, de nada vale que outros o façam. Mais um ponto em que só, a meu ver, os justos concordam. 

Voltando a centrar-me em mim próprio, o meu problema neste momento são as mil e uma ideias que voam pela minha cabeça. Será que devo pôr Raptors? Porque é que ao atirar-se da janela ele vai parar a um navio de luxo? A terra não tem 4600 M.a.? Quem é que ele é afinal? Porque tenho tantos problemas com o nome? É só um nome, nem parece que tanta gente me conhece. Isto são apenas exemplos de questões que apenas responderei: Não; Isto é estúpido; Que é que isto tem a ver com a ideia original?; Isto não é um filme; etc. 

No fim, aquilo que irei escrever, pouco ou nada terá a ver com estas questões, se é que o chegarei a fazer. É muito frustrante quando as ideias que nos surgem afastam-nos da ideia original, e da possível mensagem que queremos transmitir. Aí temos um autêntico conflito de interesses, que a meu ver só pode ser resolvido com a construção de duas obras paralelas, e completamente distintas.

Mas aí regresso ao início. De mil e uma volto a ter apenas uma ideia. Essa ideia continua sem fundamento, sem finalidade e sem sentido de fim. Talvez seja melhor descartá-la. Mas não o quero fazer. Terei que arranjar maneira de me desenrascar. 

Nem sempre somos obrigados a seguir uma ideia à letra para que a mensagem não deixe de ser transmitida, ou para que ela saia tal como queríamos que saísse, ou, quem sabe, até mesmo melhor. Na verdade, o único sentimento que me contém, é o reconhecimento de já tantos escritores terem tido ideias semelhantes às minhas. Ideias essas que até as passaram para filme. 

Trágico facto que me arrisca a ser acusado de plágio, ou de falta de imaginação. A verdade é que nestas coisas não há verdade. Só mesmo quem está cá dentro é que é capaz de compreender as coisas pelas quais passamos. 

Espero que um dia a minha obra venha a ser criada. Quero dar vida a esta ideia interessante. Talvez chegue mesmo a ir até à fonte. Não sei. Um dia saberei, e um dia escreverei. 

Ser escritor continua a não ser tarefa fácil. Pensem muito antes de se juntarem a este Mundo, mas não o deixem de fazer. Quem sabe o que virão a descobrir.

Publicado em 21 de Julho de 2013

segunda-feira, 9 de janeiro de 2006

You've got mail

Muitos de vocês já devem ter experimentado, pelo menos uma vez, conversar com estranhos em chat rooms ou pelo Messenger. É uma verdadeira faca de dois legumes, como dizia Jaime Pacheco. Mas o legume que mais interessa, é aquele da conversa esclarecedora e interessante, que de vez em quando lá surge para nos entreter, e para nos fazer passar um bom bocado.

Depois dessa primeira conversa, ansiamos pela segunda, que às vezes continua a ser tão boa como a primeira, mas que outras vezes acaba em desgraça. Em tudo semelhante aos encontros “às cegas” que temos ao longo da nossa vida, com a facilidade de não termos que sair de casa, ou até mesmo de nos levantarmos da cadeira.

E quando não só a segunda, mas a terceira, a quarta, e eventualmente todas as subsequentes, se tornam conversas daquelas que já não somos capazes de passar um dia sem as ter? O momento em que essa pessoa vem falar connosco, ou que responde às nossas mensagens, torna-se num momento mágico. Num pequeno prazer que se concretiza diante de nós.

Alcançamos outro patamar, e começamos a partilhar momentos íntimos com alguém, que nunca vimos uma única vez. Isso às vezes resolve-se com um daqueles blind dates, que são tudo menos cegos. Um dia éramos estranhos, mais íntimos que familiares a falar por um teclado. No outro, somos duas pessoas, frente a frente, capazes de comunicar verbalmente uma com a outra.

Por vezes, a magia desaparece nesse momento e nunca mais volta. A atracção do ser interior desvanece. O pouco à vontade, aquela vergonha de estar ali apodera-se de nós, e acabamos por nos separar. Uma perfeita amizade que teria resultado, não fosse esta espécie de preconceito, que o destino lhe impôs, impedindo-os de se conformarem com as suas vidas no mundo real. 

Mas, felizmente, nem sempre é assim. Há quem se junte, e crie laços eternos, impossíveis de alguma vez serem quebrados. A ansiedade por aquela mensagem, por aquele aviso a alertar que recebemos um e-mail, aumenta cada vez mais. Se esse laço esbarrar com o obstáculo da distância, nem sempre sobrevive, ou então resiste apenas para ver alguma parte da magia a esvanecer. Contudo, bem gerida, a perda não é assim tão pesada.

Não devemos ter medo de explorar estes novos horizontes. Quem sabe o que podemos encontrar mais além? Só se experimentarmos é que o descobrimos. Até mesmo para fomentar os laços com alguém que apenas vemos uma vez por dia, e com quem não desenvolvemos grandes conversas, este é um óptimo lugar. 

Não o devemos temer, nem menosprezar. Devemos aceitá-lo como mais uma daquelas dádivas tecnológicas que nos ajudam a manter-nos ligados ao Mundo.

Deixem o preconceito para trás. Esqueçam os vossos estereótipos. Ignorem quem vos tentar deter. Abracem esta oportunidade. Descubram o verdadeiro prazer de receber aquele e-mail, aquela mensagem instantânea, que mesmo num dia triste, vos alegra para o resto da vida. 

Publicado em 18 de Julho de 2013