quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Romance às Portas de Amesterdão

Amesterdão: Liberdade, drogas, prostituição, noite. Por mais que tentem convencer a vossa cara-metade que apenas querem lá ir para ver os quadros de Van Gogh, visitar o Madame Tussauds, passear pelos canais e sentir a melancólica atmosfera da Casa de Anne Frank, desenganem-se. Ela não vai acreditar. Não vale a pena sequer dizer que os jogos do Ajax, e o Hard Rock Café, são os únicos pedaços da vida nocturna da capital holandesa que têm ideias de experimentar. Se vais a Amesterdão, vais acabar a noite no Red Light District. Quer queiras, quer não, é inevitável.

Como resolver esta situação e conjugar o melhor dos dois mundos? A solução mais simples é levá-la contigo e aproveitar a viagem para cultivar o romance na vossa relação.

Santpoort Noord - Holanda - (foto de Adriano Cerqueira para o blog Vontade de Viajar)

Santpoort Noord, contraste e relaxamento

Espera aí. Romance? “Essa é provavelmente a última palavra que alguma vez pensei ver associada a Amesterdão”, pensas tu. Mas a poucos quilómetros dessa “metrópole do pecado”, encontras Santpoort Noord. Uma pequena cidade nos arredores de Haarlem. Rodeada por floresta, parques verdejantes, e a pouca distância da praia, esta pacata localidade não tem um único prédio acima de três andares.

Caracterizada pela típica arquitectura holandesa, Santpoort é uma comunidade de casas individuais, com estradas em tijolo, ciclovias e trilhos para caminhadas. A maioria das casas tem um jardim à sua volta e grandes “montras” em lugar de janelas. Não estranhem ver as famílias locais a conviverem calmamente nas suas salas, como se estivessem a expor a sua vida privada para quem por ali passa. É um acto normal para eles, contudo, é considerada má educação, ficarem ali parados a olhar. Controlem o vosso instinto de voyeurismo e, simplesmente, ignorem.


Subir para a Praia, e Nortadas a sério

Se caminhar pela floresta e andar de bicicleta não é bem do vosso agrado, podem sempre ir passear à praia. Durante o Verão, especialmente no final de Julho, é comum organizarem-se luaus, e outras festas junto ao mar. As praias holandesas são bem diferentes daquelas que podem encontrar em Portugal ou Espanha. Antes de chegarem ao mar, passam por enormes morros, ou diques, que separam a constante ameaça das ondas dos restantes terrenos. Afinal de contas existe um motivo para se chamarem Países Baixos. Sabem como normalmente têm que descer para ir à praia? Em Santpoort têm que subir!

Assim que lá chegam, o primeiro obstáculo que vão sentir é o vento. Se pensam que as nortadas são más, é porque nunca passaram por isto. A erosão provocada pelo vento é tão forte que a própria areia parece farinha. Muito agradável de se sentir por entre os dedos dos pés, mas pouco prática para o típico veraneante que gosta de torrar ao sol, e dar um ocasional mergulho no mar.


Por entre Moinhos e Tulipas

Mesmo no centro de Santpoort podem encontrar o Brasserie De Wildeman, um pub com esplanada que também serve refeições. Um bom espaço para relaxarem, acompanhados por uma cerveja Amstel. Podem também experimentar a típica comida holandesa. Muito à base de fritos, não é a mais saudável, confesso, mas não é má de todo.

A região de Haarlem é famosa pelos seus moinhos e plantações de tulipas. Se visitarem durante a Primavera, vão ser maravilhados por campos coloridos que se estendem até ao horizonte. Se for o caso, aconselho-vos a alugarem um carro para poderem explorar bem essa região. Um bom espaço para o fotógrafo amador iniciar um portfólio florido para partilhar com os seus amigos.

Foto: Adriano Cerqueira

De Weyman, o fim ideal para um dia perfeito

Cansados após um longo dia de passeio? A noite de Amesterdão deixou-vos de rastos? Nada como o Hotel De Weyman. O local ideal para relaxarem e passarem uma noite calma a dois. Por fora, De Weyman quase que passa por mais uma casa holandesa, contudo, é bastante espaçoso. Os donos são simpáticos, falam um inglês fluente, e estão sempre disponíveis para vos ajudar. O próprio Hotel tem um bar, e também serve refeições.

Cheiraram as tulipas, passearam pela praia, e beberam uma Amstel no De Wildeman. Está na hora de finalmente darem um salto a Amesterdão. Embora ir de carro possa parecer uma opção mais cómoda. Os vossos bolsos vão agradecer se forem de comboio. Os parques de estacionamento em Amesterdão, embora comuns, são excessivamente caros. Em algumas zonas, podem mesmo chegar a cobrar seis euros por hora. Os comboios entre Santpoort Noord e a capital holandesa são bastante regulares, e a viagem não demora mais de meia hora.

Santpoort Noord é uma agradável alternativa à confusão metropolitana de Amsterdão. Um contraste improvável entre uma noite boémia, e umas férias românticas, a poucos quilómetros de distância.

Publicado em 25 de Setembro de 2013 no Blogue Vontade de Viajar
Reeditado em 10 de Outubro de 2013

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Eurotrip: Prólogo

“Não o consigo acompanhar. Não com este ritmo”. O cansaço apoderava-se de mim. As minhas energias escoavam pela sola das sapatilhas. Cada passo que emergia sob o suave piso laranja deste circuito de manutenção, sentia-o como um martírio contínuo, sem fim à vista. Pura estamina e força de vontade. Nada mais me fazia seguir em frente. A mente ignorava a dor que assolava o meu corpo. Apenas assim, podia continuar a correr. 

O Luís já ia lá à frente. “Já falta pouco”, pensava. Faltava pouco mas não o podia acompanhar. Baixei o meu ritmo. Perdido num limbo entre o Luís e o Paulo, os dois em extremos opostos de velocidade. Tinha que encontrar o meu passo. Não podia parar. Não podia pensar. Tinha que descansar em corrida.

Este era um Verão atípico. Frio. Céu mais vezes cinzento, que azul. Todas as semanas, mais do que uma vez, Eu, o Luís e o Paulo, encontramo-nos para correr ao final da tarde. À mesma hora, no pequeno jardim da Rotunda do Carregal. É aí que iniciamos o nosso percurso.

Construído na última década, a Avenida da Régua tem agora um circuito de manutenção. Dois caminhos alaranjados, próprios para correr, caminhar, ou passear de bicicleta. A principal artéria que liga Ovar à Praia do Furadouro, ganhou assim uma nova vida. Todos os dias, faça chuva, ou faça sol. No frio do Inverno, ou no calor do Verão. Todos os dias, várias pessoas juntam-se neste percurso para praticar exercício. Seja ele solitário, ou entre amigos. Esta é uma nova tradição vareira. O culto de uma vida saudável, numa terra regada por espaços verdes, pelo mar, e pela paisagem natural da Ria de Aveiro.

O nosso ritual é cumprido de forma quase ortodoxa. Do Carregal até aos Bombeiros, dos Bombeiros até ao Carregal. Sempre a correr. Alongamentos no jardim e uma caminhada até ao Furadouro. Finalizada com o já habitual momento de contemplação do pôr-do-sol, em um dos esporões que povoam a paisagem. Deixo a minha mente apagar-se perante a imensidão do oceano. Descanso, e encontro alguma paz.

Mas esse momento ainda estava longe. O Luís já ia lá à frente. Não o podia alcançar. Ainda tinha mais um quilómetro por percorrer. Decidi abrandar ainda mais e aguardar pelo Paulo. Sem parar. Não podia parar. Não tardou até que ele me alcançasse. Visivelmente cansado, sempre me questionei porque ele teimava em levar o telemóvel consigo. Embora a música seja boa para manter a cabeça ocupada, o peso extra não o ajudava.

Adoptei o seu ritmo mais calmo, e continuei. As minhas forças começaram a recuperar aos poucos. A dor que sentia começava a esvanecer. Quando finalmente chegámos ao Carregal, não queria parar. Chamei pelo Luís, que já descansava, no jardim, para continuar connosco. Ele disse que seguia a pé, mais tarde. O Paulo concordou, e continuámos a correr em direcção à Praia.

Como se tivesse rejuvenescido, sentia que era capaz de ultrapassar os meus anteriores limites. “Era desta que ia conseguir fazer seis quilómetros seguidos sempre a correr”. Este pensamento motivou-me. O cansaço continuava ali, mas algo mais estava a puxar-me em frente. Já não estava em esforço. Ia conseguir. Perdidas em alguma reserva desconhecida, consegui recuperar as energias necessárias para ultrapassar esta barreira. Era livre. Naquele momento, eu iria voar.

Quando estávamos a pouco mais de 500 metros do fim, o ritmo do Paulo já não era suficiente para mim. Acelerei. Corri. Mais rápido do que antes. Mais rápido do que alguma vez tinha conseguido. O Paulo seguia-me, não muito atrás.

Continuei até às Varinas na entrada do Furadouro. Saltei para dentro da Rotunda, e como o Rocky, ergui os meus braços para o céu. O Paulo chegou pouco depois. Já pelo caminho festejávamos este feito, que à partida, nenhum de nós acreditava ser possível de alcançar.

Aguardámos pelo Luís que ainda tardou um pouco a chegar. Não me lembro de alguma vez me sentir tão feliz por algo que, para muitos, não passava de um feito banal. 

Reunimo-nos os três no esporão. Ainda faltava algum tempo para o anoitecer. O Luís foi o primeiro a falar.

“Uns amigos estão a pensar organizar uma viagem de carro pela Europa. Vocês alinham?”

“Uma roadtrip europeia?”, perguntou o Paulo.

A ideia parecia-me cara, mas uma voz adormecida nos confins da minha mente, gritava pelas palavras de um escritor que, ainda, não conhecia. “O importante é partir, não é chegar”.

“O importante é partir”, disse para mim próprio.

Passado algum tempo, regressámos ao meu carro. Pelo caminho partilhávamos ideias. Raramente interessantes, projectos, e histórias com pouco, ou nenhum sentido.

O Paulo foi o primeiro a sair, ou não vivesse ele bem próximo do centro da cidade. Típica cidade do litoral português, o centro de Ovar é uma praça simples em calçada de granito, com a Câmara Municipal, alguns serviços e restaurantes, e uma Igreja de Santo António que, numa freguesia cujo Patrono é São Cristóvão, santo protector dos viajantes, acaba por deixar algum mistério na sua origem. 

E em viagem seguimos, de regresso a casa.  Breves quilómetros atrás do volante, por ruas já muito familiares. Demasiado familiares. Era hora de partir. “Em qualquer viagem, o importante é partir.”

“Luís, podes contar comigo. Já era tempo de fazermos uma Eurotrip!”

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

XXII

Todas as luzes no céu são estrelas (título original)

Um sentimento de Fogo cresce.
Dentro de mim,
Uma chama acesa,
Solitária, luta contra a escuridão.

Fogo. Que se alimenta de emoções,
Não de Ira, Raiva, Amor ou Paixão.
Mas de uma voz, uma voz que grita,
Que anseia por Resolução.
Por se fazer ouvir,
Por Determinação.

Chama que consome.
Envolve a penumbra,
Ilumina o Universo,
E cresce.

Cresce, consome.
Aquece tudo em seu redor,
Penetra pelas paredes, da sua própria existência.
Arrebata as redes da sua Negação,
Propaga o seu alcance,
Até ao extremo do seu lar.

Ultrapassa-se a si própria.
Liberta-se das amarras.
Amarras que a detém,
Nós cegos, por si feitos.
Feitos, assim. E por si, enfim Desfeitos.

Chama interior,
Nascida estrela,
Vive, olvidada, envolta em escuridão.
Sonho, desperto.
Fome de Motivação.
Fogo descoberto,
Não mais encoberto.

Dúvida, Incerta.
Certeza, dúbia.
Insignificantes palavras,
Frente tão bela e luzia, esperança.
Hoje desperta,
Não mais dormente.

Todas as luzes no céu são estrelas,
Como é, tão bem, estrela esta luz.
Todas as chamas são fogos,
Fogos amigos, que a estrelas ambicionam.
Que dia, após dia, sonham,
Com a luz, que assim se concretiza,
E com a estrela, que enfim, neste dia desperta.

Covilhã, 19 de Julho de 2013